Ronnie James Dio
Será que existem dúvidas de que Ronnie James Dio é o melhor vocalista da história do heavy metal?
Sua carreira, desde o ELF – sim, houve antes o The Electric Elves e o The Elves, mas por questões discográficas, pra simplificar, começaremos a contar pelo ELF -, passando pelo Rainbow, Black Sabbath, até a sólida fase solo, se entrelaça à história do heavy metal, construindo e desconstruindo, praticamente, as melhores formas deste gênero.
A imagética fantástica e épica que cultivava, casava perfeitamente com sua voz forte e dramática, quase num estilo operístico, mas sem perder o impacto em todas as formas clássicas de rock e heavy metal, criando algo difícil na música moderna: uma marca musical, reconhecível nos primeiros segundos e por vezes copiada.
Hoje, pretendo eleger cinco discos essenciais de toda a carreira deste ícone que foi Ronnie James Dio. Claro que estes podem não ser unanimidade como os melhores de sua carreira (pra mim, eles o são), mas creio que são, de fato, os principais para dar um panorama completo de sua obra.
1. ELF: “Carolina County Ball” (1974)
Infelizmente o Elf é um nome reconhecido pelo grande público roqueiro apenas como sendo a banda de Ronnie James Dio que se juntou a Ritchie Blackmore para formar o Rainbow.
Porém ela é uma típica banda de Blues Rock setentista, oscilando entre a lascívia do Blues e a experimentação da psicodelia, que tem neste disco o ápice de sua tríade discográfica.
“Carolina County Ball”, lançado em abril de 1974, com produção de Roger Glover, trazia linhas vocais nobres, guitarras que invadem o cérebro, e um piano boogie de Mickey Lee Rourke que era o diferencial do Boogie pesado delineado nas nove composições, com claras influências da música tradicional norte-americana.
De cara, os vocais de Dio se destacam, emergindo do caldo musical com força e desenvoltura, principalmente nas duas melhores faixas do disco: 1)“Ain’t It All Amusing”, um rock pesado e libidinoso aos moldes do Led Zeppelin por uma lascívia quase tribal, dando a oportunidade de Dio mostrar um pouco da nobreza metálica que o consagraria anos mais tarde; e 2) “Happy”, uma típica composição que clama pela companhia de uma dose de Jack Daniel’s.
Em dezembro de 1974, Ritchie Blackmore e Dio começariam a trabalhar juntos no que viria a ser a banda Rainbow, cujo primeiro álbum sairia em 1975, ano em que o ELF lançaria seu último trabalho, “Trying To Burn The Sun” (que resenhamos aqui) e seria enterrado para sempre.
2. Rainbow: “Rising” (1976)
A história nos conta que, encantado com a voz de Ronnie James Dio, à época ainda no Elf, Ritchie Blackmore, ainda no Deep Purple, convidou o vocalista para registrar um cover do Quatermass, para a faixa “Black Sheep of the Family”, que seria lançada como single solo do guitarrista.
Porém, Blackmore percebeu que a composição inédita, “Sixteenth Century Greensleeves”, que iria para o Lado B do single, ficou excelente, motivando-o a evoluir de duas músicas para um álbum completo, gravado entre fevereiro e março de 1975.
Este álbum seria o primeiro do Rainbow, que Dio gravou ao mesmo tempo em que o Elf registrava “Trying to Burn the Sun”, terceiro álbum da sua (àquela época) banda principal.
Para economizar tempo e esforço, Blackmore convocou os integrantes do Elf, exceto o guitarrista Steve Edwards, claro, para registrar o que nasceria como “Ritchie Blackmore’s Rainbow”, em 1975, iniciando a história de uma das mais importantes bandas do Rock.
Essa formação duraria apenas até a gravação do primeiro álbum, tanto que, exceto por Dio, Blackmore trocou todo o restante da banda para produzir “Rising”, o próximo trabalho.
Foi exatamente em “Rising”, lançado em 1976, que Dio começou a inserir em suas letras os temas de fantasia, inspirados em magia e literatura épica.
Já Blackmore vinha extrapolado suas habilidades musicais de uma forma que o Deep Purple não permitia, mas que seria encerrada já neste disco, afinal, “Long Live Rock N’ Roll” (1978), o próximo álbum, já buscaria um caminho musical mais direto e as rusgas entre o guitarrista e o vocalista começariam, até que Dio deixaria o Rainbow em 1979.
“Rising” é o ápice musical do Rainbow, e faixas como “Startruck”, “Tarot Woman”, “Stargazer” (um hard rock progressivo e pesado, e atenção à bateria de Cozy Powell), e “Do You Close Your Eyes”, além da belíssima capa de Ken Kell, comprovam isso!
3. Black Sabbath: “Heaven and Hell” (1980)
À partir de 1976, com “Technical Ecstasy”, a situação começava a ficar crítica, e a decadência da primeira formação do Black Sabbath, a principal banda de heavy metal daqueles dias, era evidente.
Em 1977, o pai do vocalista Ozzy Osbourne morre, e aliado ao consumo de drogas e bebidas o vocalista surta, briga com todo mundo na banda, e chega a deixar o posto.
Num primeiro momento voltaria atrás, gravando “Never Say Die” (1978), mas seria sacado da banda por um misto de vontade de experimentar novos horizontes e um convite para sair por parte do guitarrista Tony Iommi.
O substituto foi ninguém menos Ronnie James Dio, já consagrado no meio do heavy rock.
“Heaven & Hell”, lançado em 1980, é o primeiro álbum de Dio no Black Sabbath, e um dos três melhores discos da história da banda, fato confirmado por colecionar alguns dos melhores riffs de Tony Iommi, e os vocais dramáticos que renovaram e revitalizaram a sonoridade dos inventores do heavy metal.
Clássicos? Um desfile deles.
A começar pela faixa-título, passando por “Neon Nights”, “Children of the Sea”, “Die Young” e “Wishing Well”, faixas que mostravam, além de excelência melódica e dramática em prol do heavy metal, um direcionamento dinâmico que antecipava o futuro do gênero nos anos 1980.
É necessário mencionar que muito do grandiosidade de “Heaven and Hell” vem de das mãos do produtor Martin Birch (também produtor de “Rising”, do Rainbow, além de “Slide It In”, do Whitesnake, e os maiores clássicos do Iron Maiden).
Posteriormente, já com Vinnie Appice na bateria, o Black Sabbath lançaria, ainda com Dio nos vocais, o não menos emblemático “The Mob Rules” (1981), mas a banda rachou literalmente ao meio durante a mixagem do ao vivo “Live Evil” (1982), causando a saída de Dio e Appice.
A dupla voltaria ao Black Sabbath no início dos anos 1990, e registraria um dos melhores discos de heavy metal daquela década. “Dehumanizer” foi lançado em 1992 e poderia muito bem estar nessa lista, e é, de longe, um dos discos mais pesados do Black Sabbath.
Dio e Appice ainda reencontrariam Iommi e Geezer Buttler em 2006, mas agora, como já havia ocorrido uma reunião da formação cássica do Black Sabbath, com direito a introdução dela no Rock n’ Roll Hall of Fame, o quarteto foi batizado como Heaven & Hell, e gravou o impactante “The Devil You Know” em 2009, uma outra obra-prima que poderia muito bem estar nessa lista. Infelizmente, Dio morreria no ano seguinte.
4. DIO: “Holy Diver” (1983)
Após passar por três bandas em pouco mais de uma década, duas delas de relevância ímpar, Dio decidiu que era hora de seguir carreira solo.
Com a cisão do Black Sabbath após “The Mob Rules”, o vocalista chamou o baterista Vinnie Appice para a empreitada, além do velho conhecido Jimmy Bain, outrora baixista do Rainbow, e recrutou o jovem guitarrista Vivian Campbell no Sweet Savage.
Um time de primeira linha que ajudaria Dio a produzir “Holy Diver” (1982), primeiro álbum de sua carreira solo.
E que álbum!
“Holy Diver” impressiona pela alta qualidade de canções como “Rainbow in the Dark”, “Don’t Talk to Strangers”, “Caught in a Middle”, “Gypsy”, “Stand Up and Shout”, “Straight Through the Heart” e a faixa-título, com linhas vocais instigantes e bem desenhadas, assim como Campbell desenvolve um dos seus grandes trabalhos em estúdio.
A criatividade estava em alta, e existem melodias acessíveis entremeadas ao peso do heavy metal clássico, e em questão de importância, este talvez seja o disco mais importante (não o melhor) de sua carreira solo, pois aqui Ronnie James Dio mostrava que tinha força, talento e know how para criar uma carreira solo relevante. Afinal, “Holy Diver” fez barulho ao angariar posições interessantes em charts do Estados Unidos e do Reino Unido.
5. DIO: “The Last in Line” (1984)
Se “Holy Diver” é o disco mais importe da carreira solo de Dio, pela consolidação já no primeiro álbum, sem dúvidas, o passo discográfico seguinte, “The Last In Line” (1984), é o melhor em termos musicais.
Que o digam clássicos como “We Rock”, “Egypt (The Chains Are On)”, “The Last In Line” e “Evil Eyes”, que fazem desta afirmação (à priori, estranha) plenamente plausível.
O quarteto deu continuidade à mágica musical de antes, mas o evidente entrosamento entre os músicos, conquistado após a turnê de “Holy Diver”, fez a diferença no resultado final, principalmente na cozinha de Jimmy Bain e Vinnie Appice.
Porém, “The Last In Line” é o disco que afirma Vivian Campbell como um dos grandes guitarristas de sua geração no heavy metal/hard rock, e um pilar de sustentação da primeira e melhor fase da carreira solo de Ronnie James Dio, completada pelo interessante “Sacred Heart” (1985) e o ao vivo “Intermission” (1986).
Tanto que após a saída do guitarrista, em 1986, para entrar no Whitesnake, a banda de Dio nunca mais conseguiu repetir a excelência musical destes dois primeiros álbuns, mesmo que “Dream Evil” (1987), “Magica” (2000) e “Killing the Dragon” (2002) sejam discos para serem conferidos em caráter obrigatório.
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