Escolhemos cinco discos para representar as quase três décadas da inquietude musical do Amorphis que forjou álbuns tão diferentes quanto marcantes pela identidade sonora que fundia metal, folk e progressivo.
Poucas bandas podem se gabar do controle de qualidade altíssimo de sua discografia. Desse grupo, uma porcentagem ainda menor conseguem dizer que criaram uma identidade tão forte que quase geraram um subgênero inteiramente para si em torno de sua abordagem musical. Uma destas, de fato, é o Amorphis!
Oriundo da Finlândia, o Amorphis é um dos nomes que detém uma das personalidades mais reconhecíveis no meio heavy metal na atualidade, cunhada numa das maiores metamorfoses sonoras vistas ao longo da carreira de uma banda de heavy metal.
Numa análise rápida da discografia do Amorphis você verá uma banda criativa e artisticamente livre, sem apego a rótulos e muito menos a seus cânones, numa viagem musical que se expandiu em experimentações e posteriormente se contraiu numa personalidade própria amadurecida pelo que de melhor experienciaram.
Eles foram desde o death metal à moda escandinava, à exploração folk no metal extremo, passando por experimentalismo, evoluções progressivas, e abordagens alternativas, quase sempre se valendo de temas ligados aos poemas épicos da mitologia nórdica.
O Amorphis, hoje, é um dos poucos nomes que podem, de fato, se vangloriar de ter uma identidade facilmente reconhecível, muito pelas guitarras de Esa Holopainen e Tomi Koivusaari (durante alguns anos também vocalista). Desta forma, a rica discografia da banda oferece uma variedade que dificulta nossa proposta de hoje escolher cinco discos essenciais de sua obra. Mas vamos nessa! Confira nossas escolhas abaixo.
1 – “Tales From a Thousand Lakes” (1994)
Obviamente, não nada pra deixar esse disco de fora, pois ele mudou o jogo dentro do metal extremo! Em seus primeiros anos, o Amorphis praticava um death metal dentro da mais perfeita tradição escandinava dos anos 1990. Dessa época, o álbum “The Karelian Isthmus” e o EP “Privilege of Evil”, de 1992 e 1993, respectivamente, mostravam o que de melhor o death metal finlandês podia oferecer.
Porém, mesmo ali víamos uma banda diferenciada, preocupada com climas e ambientações, já com as melodias melancólicas e de leve apelo folk, além de alguns detalhes que fugiam às normas, como os teclados e efeitos pontuais. Mesmo assim, tudo ali remetia ao death metal escandinavo comum, e como veríamos logo mais, em sua discografia, aquela não era a identidade musical da banda.
No álbum seguinte, “Tales From a Thousand Lakes”, o Amorphis já mostraria que podia oferecer mais ao buscar uma identidade ainda mais folk para banhar sua música de melodias frias, sombrias e melancólicas. Nessa época, primavam por um death metal diferente, que misturava passagens de progressivo (mais para o clima do Pink Floyd do que o tecnicismo do Yes) resultando em um estilo único, usando de perspicácia e originalidade como guia para chegar até está obra magnífica que fez da banda um dos nomes mais influentes e originais do heavy metal.
“Tales from a Thousand Lakes” trazia um resultado único em forma e estilo, que virou o alicerce da personalidade do Amorphis. Eles foram ousados ao inserir vocalizações limpas, teclados e melodias numa época em que o death metal era um gênero mais tradicionalista e ensimesmado. Canções como “Black Winter Day”, “Forgotten Sunrise” (atenção às guitarras dessa música), “Magic and Mayhem” e “Moon And Sun” mesclavam elementos de heavy metal tradicional, doom metal, progressivo, mas sem deixar o death metal de lado, usando do contraste entre os vocais guturais de Tomi Koivusaari e os limpos do convidado Ville Tuomi, e criavam uma musicalidade corajosa para a época em que se encontrava.
Sem medo de exagerar, “Tales from a Thousand Lakes” é o álbum mais vanguardista do metal extremo no início dos anos 1990, até mais do que o clássico “Gothic”, do Paradise Lost (para o qual, inclusive escrevemos esse texto especial).
2 – “Elegy” (1996)
Esse é o álbum que tem o hino da banda, “My Kentele”, e só por isso sua inclusão nessa lista era obrigatória! Mas não só por isso! Com a repercussão de “Tales from a Thousand Lakes” o Amorphis resolveu olhar para frente. Como os vocais limpos funcionaram dentro da fórmula, decidiram integrar o vocalista Pasi Koskinen para desenvolver ainda mais a estética que amplificava o atrito com as linhas guturais de Tomi Koivusaari (que, aliás, se destacam em “Against Windows”, outro destaque imperdível deste disco).
Além disso, reforçaram mais ainda os elementos da música folclórica finlandesa, que junto aos teclados de Kim Rantala (que substituiu Kasper Mårtenson) deram uma proximidade maior com a música progressiva. Muito também pela coragem em experimentar instrumentos alheio ao heavy metal, como sitar e acordeão. Outra mudança importante foi na bateria: saía Jan Rechberger e entrava Pekka Kasari. Podemos dizer que, nesse caso, ao contrário dos teclados, a mudança não foi tão positiva para a banda.
O Amorphis conseguia, em dois álbuns consecutivos, se reinventar e cunhar dois clássicos diferentes entre si, mostrando todo o potencial de reinventar sua musicalidade, fato marcado também em faixas como “On Rich and Poor” e “Cares” (com a passagem mais experimental do álbum), além das já citadas “My Kentele” e “Against Windows”. Com “Elegy” o Amorphis começava a diminuir os vocais guturais, abrindo mais espaço para as linhas limpas e olhava com atenção o que seus congêneres praticavam rumo à música do final do século. Um estudo que refletiria fortemente no próximo álbum, “Tuonela”.
3 – “Tuonela” (1999)
Este é o passo natural após “Elegy”. Imagino que muitos preferiam em nossa lista, no lugar deste disco, “The Karelian Isthmus” (1992), “Syforger” (2009) ou até mesmo “Far From the Sun” (2003), mas “Tuonela” é um disco que reside entre as particularidades do passado e as implicações do futuro musical a ser apresentado na próxima década, à começar pelo ótimo “AM Universum” (2001).
“Tuonela” traz uma sonoridade livre de ideias pré-concebidas, onde a criatividade se via não mais encastelada em nenhum dos rígidos padrões do metal extremo.
Claramente vemos uma banda se arriscando, explorando texturas, sentimentos e abordagens de uma forma única, com apelo progressivo e diferente de tudo o que já tinham feito ou fariam. Limparam boa parte dos vocais agressivos, chafurdaram no modernismo do alternativo (isso desde a abertura com “The Way”), mas mantiveram a assinatura melancólica nas guitarras, mesmo que buscassem um passo além do quesito musical.
Até o logo estava diferente. Porém, os temas das letras permaneciam baseados na “Kalevala”, epopeia nacional da Finlândia, escrita/compilada por Elias Lönnrot. Tanto que Tuonela é o nome para o reinos dos mortos na mitologia finlandesa, assim como Hades, na mitologia grega.
Outra coisa que permanecia a mesma era a ousadia em buscar instrumentação variada para construir sua sonoridade. Além da sitar que permanecia do álbum anterior, agora tínhamos um saxofone e flautas inteligentemente alocados nos arranjos, ambos executados por Sakari Kukko, que também aparece como tecladista convidado.
Mesmo que possamos traçar paralelos com o que faziam na mesma época nomes como Paradise Lost, Katatonia, e Crematory, é observável que o Amorphis tinha mais personalidade e uma bem definida carta de intenções em seu experimentalismo. Experimentalismo que atingiria seu ápice no álbum seguinte: “AM Universum” (2001), outro que poderia muito bem estar em nossa lista por causa do clássico “Alone”!
A parceria com o multi-instrumentista Sakari Kukko continuava, dando origem a faixas ainda mais acessíveis (movidas a refrão e melódias) para uma banda que começou no metal extremo. Sakari ficou responsável pelo saxofone que aparece em cinco das dez faixas, já que os teclados agora estavam nas mãos de Santeri Kallio.
Voltando a “Tuonela”, mesmo com toda a mudança musical, não dá pra ignorar um disco que tem “Greed”, não só uma das melhores faixas do Amorphis, mas quase um molde do que veríamos em desdobramentos do que chamaríamos de folk metal. Além dela, se destacam “Morning Star”, “Divinity” e a folk “Rusty Moon”. Definitivamente esse é um disco a ser redescoberto pelo fãs da banda.
4 – “Eclipse” (2006)
Após “AM Universum” (2001), e a volta do baterista Jan Rechberger, o Amorphis tentou uma espécie de inserção novamente aos elementos clássicos em “Far From the Sun” (2003). Isso era algo já evidenciado na capa, mas a pouca inspiração do material era também evidencia de que a fase com com Pasi Koskinen já tinha rendido o máximo que podia.
Ao mesmo tempo, esse foi o disco funciona como uma espécie de transição para o que ouviríamos da banda em sua próxima fase de ouro.
O Amorphis então recrutaria o vocalista Tomi Joutsen que tinha um trunfo importante para a sonoridade da banda: era capaz de realizar tanto as linhas limpas como as guturais. Isso dava às composições ainda mais amplitude de evolução, o que rendeu “Eclipse”, em 2006, facilmente um dos três melhores discos de sua discografia.
Com “Eclipse” o Amorphis era capaz de unir tudo o que deu certo em sua música, desde a agressividade do metal extremo ao apelo acessível da fronteira entre o acessível e o alternativo. O que pode parecer um conflito entre duas abordagens diametralmente opostas, o Amorphis realiza como um amálgama bem equilibrado gerando faixas como “House of Sleep”, “The Smoke”, “Leave Scars” e “Perkele (The God of Fire)”, que se encaixam como peças de um quebra-cabeças musical alinhado ao pensamento progressivo.
Novamente o Amorphis se vale do folclore finlandês para seus temas, agora usando a saga do personagem Kullervo, só reforçando o fato de estar consciente e dominante da arte que queria produzir, enquanto revisitava seu próprio legado.
A sequência de discos com Tomi Joutsen é irrepreensível. “Silent Waters” (2007) e “Skyforger” (2009) refinavam a estética musical do Amorphis pela modernidade, com foco na técnica e no preocupação com os arranjos, que estão trabalhados ao mínimos detalhes, indo mais fortemente ainda em direção ao progressivo, mas sem excessos de virtuose. O Amorphis já havia encontrado o seu equilíbrio através da diversidade de sua própria inquietude criativa.
5 – “Under the Red Cloud” (2015)
O fim da primeira década do novo milênio parecia ter renovado a chama do Amorphis para olhar com mais atenção para o passado. Tanto que em 2010 eles lançam “Magic & Mayhem – Tales from the Early Years”, uma compilação de regravações das músicas de seus três primeiros discos, rearranjadas, e com alguns vocais de Tomi Koivusaari, algo que não acontecia em estúdio ha mais de uma década.
Porém a sequência da discografia trouxe dois discos relativamente fracos em comparação ao que ouvimos na década anterior: “The Beginning of Times” (2011) e “Circle” (2013) deixaram dúvidas acerca do que a banda produziria dali em diante. Mas estes discos eram apenas um mergulho para impulsionar um salto de qualidade que renovaria mais uma vez a música do Amorphis em “Under the Red Cloud”.
Neste álbum o Amorphis explora todos os elementos que permearam sua música durante mais de duas décadas, tão rica quanto diversificada, todavia, sempre mantendo ingredientes tradicionais que criaram sua identidade marcante.
Temos timbres tradicionais, vocais agressivos em contraste aos limpos e linhas progressivas, misturadas a densas guitarras góticas, além de um leve e costumeiro tempero folk bem desenhado em faixas como “White Night”, “Death of a King”, “The Four Wise Ones”, e “Dark Path”, representando um álbum empolgante, dinâmico, carregado de melodias inteligentes e andamentos climáticos, além de um irrepreensível trabalho de guitarras.
A variação da melodia vocal, ora nos versos, ora nos refrãos, alternando com os guturais, dentro de cada composição ainda era uma arma poderosa no dinamismo de suas músicas que equilibram melodia e aspereza, crueza e grandiloquência, melancolia e brilho, potencializando o melhor de cada aspecto pelo atrito de texturas, velocidades e peso.
O resultado final é um disco que exala bom gosto! E é perceptível ao ouvir o disco seguinte, “Queen of Time” (2018 – e que resenhamos aqui), que a proposta iniciada em “Eclipse”, álbum de 2006, aquele primeiro com o vocalista Tomi Joutsen, ao que parece, foi fechada em “Under The Red Cloud” (2015), nos mostrando o quão instigante o Amorphis é para seus fãs. Nunca se sabe o que podemos ouvir no próximo trabalho!
Leia Mais:
- Paradise Lost – “Lost Paradise” (1990) | Você Devia Ouvir Isto!
- Death Metal | 11 Discos Para Conhecer o Metal da Morte
- Amorphis | Resenha de “Queen of Time” (2018)
- Katatonia – “Brave Murder Day” (1996) | Você Devia Ouvir Isto
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