Apesar de sempre lembrado como parte da cena hard rock dos anos 1980, do que se convenciona chamar de hair metal, o Whitesnake já nasceu grande na década anterior, sempre centrado na figura do vocalista David Coverdale.
O cantor de voz potente e expressiva tinha cravado seu nome na história do rock ao integrar a melhor formação do Deep Purple, batizada de MK III. Um verdadeiro dream team do hard rock, incluindo, além do vocalista, o baixista/vocalista Glenn Hughes ao lado dos remanescentes da MK II, Ritchie Blackmore (guitarra), Ian Paice (bateria) e Jon Lord (teclado).
Desta forma, quando o Deep Purple entrou no seu hiato que ia de 1976 a 1984, Coverdale não teve problemas em dar continuidade a sua carreira, na esteira de sua explosiva ascensão. Porém, seus primeiros trabalhos fora do Deep Purple foram dois discos solo: “White Snake” (de 1977) e “Northwinds” (de 1978, que merece ser conferido por ser o melhor dos dois), ambos trazendo o baixista Roger Glover para a banda e o guitarrista Micky Moody.
David Coverdale agora podia explorar todas as suas influências e estes discos, segundo ele próprio, foram influenciados pela Allman Brothers Band. Após quase entrar no Uriah Heep, ele resolver fundar sua própria banda, o Whitesnake!
O Whitesnake como conhecemos hoje foi formado em 1978, trazendo músicos respeitados da cena roqueira (como os guitarristas Micky Moody e Bernie Marsden, o baixista Neil Murray, o tecladista e ex-companheiro de Deep Purple, Jon Lord, e o baterista Dave Dowle) dedicados a um hard rock direto e cheio de influências do blues.
Esta fase bluesy iria de 1978 a 1984, registrada na discografia entre os discos “Trouble” e “Saints & Sinners” (1982), que no auge trouxe Ian Paice, à época ex-Deep Purple, para o lugar de Dave Dowle, fazendo do Whitesnake 3/5 da MK III. O próprio Coverdale confessa que “rock, soul e blues, são esses três elementos que eu utilizo para me expressar musicalmente…” O lado “comercial” e mais conhecido do Whitesnake só brotaria mais tarde, em meados dos anos 1980, após o contrato com a Geffen e a reformulação de todo o seu conceito musical.
Destas duas fases distintas na discografia, resolvemos pinçar cinco discos essenciais para se conhecer a banda de David Coverdale, um dos três vocalistas mais imitados da história do rock! Cabe mencionar que a banda permanece ativa e recentemente lançou o ótimo “Flesh & Blood”, seu décimo terceiro disco de estúdio, e que resenhamos aqui.
1. “Ready an’ Willing” (1980)
Lançado em 1980, “Ready an’ Willing” já era o terceiro disco de estúdio do Whitesnake em dois anos. Cabe menção honrosa aos dois anteriores, “Trouble” (1978) e “Lovehunter” (1979), este segundo com a melhor capa da discografia da banda, e ambos mostrando um crescimento de popularidade tímido do Whitesnake, medido pelos charts britânicos.
A primeira novidade de “Ready an’ Willing” vem na formação. Ian Paice, ex-baterista do Deep Purple, agora integrava um time de músicos de primeira: Micky Moody e Bernie Marsden nas guitarras, Neil Murray no baixo, e Jon Lord nos teclados, além do vocalista David Coverdale. Chegando ao sexto lugar no chart britânico, “Ready an’ Willing” vinha impulsionado pelo sucesso de “Fool for Your Loving”, em sua primeira versão de estúdio que figurou até mesmo na lista de sucessos da Billboard, e a faixa-título.
Mas o repertório trazia outras pérolas como “Blindman” (resgatada de primeiro álbum solo de Coverdale), “Love Man” e “Ain’t Gonna Cry No More”, faixas com groove e arranjos impecáveis, longe da estética “farofenta” que ouviríamos no fim da década. Para muitos (não o meu caso, apesar de adorá-lo), este é, e sempre será, o grande disco do Whitesnake, e historicamente foi o trabalho que rendeu a primeira turnê da banda nos Estados Unidos.
O próximo trabalho, “Come An’ Get It” (1981) já começava a sinalizar com alguns apelos comerciais destinados ao mercado norte-americano que acertaram primeiro o mercado japonês. Mas antes dele tivemos um dos últimos grandes discos ao vivo do rock.
2. “Live… in the Heart of the City” (1980)
Não costumamos incluir discos ao vivo em nossas listas como essa, mas não dá pra deixar de fora um dos maiores live albuns da história do rock! E basta uma uma conferida na versão de “Ain’t No Love In The Heart of the City” aqui presente pra ver que não estou exagerando. Um versão definitiva da composição do cantor de soul/blues Bobby “Blue” Bland.
O álbum trazia duas apresentações da banda no Hammersmith Odeon, uma de 1978, e outra de 1980, e chegou ao quinto lugar dos charts ingleses marcando na história um registro de palco da fase em que o Whitesnake dominava o hard/blues, ainda distante dos arroubos comerciais que evoluiriam nos próximos três discos até a explosão de 1987.
O repertório trazia “Come On”, “Walking in the Shadows of the Blues”, “Love Hunter”, “Fool For Your Loving”, “Sweet Talker”, e “Ready an’ Willing”, dando resumo completo do que de melhor havia nos seus três primeiros discos, além de “Mistreated ” e “Might Just Take Your Life”, do Deep Purple.
É interessante perceber como a presença de Ian Paice confere ainda mais dinâmica à banda, afinal a performance de 1978 ainda traz Dave Dowle nas baquetas, o que nos permite um interessante exercício de comparação da dinâmica da seção rítmica desta primeira fase do Whitesnake.
O próximo passo discográfico, após “Come An’ Get It” (1981), seria “Saints & Sinners” (1982), o último disco com Ian Paice e Jon Lord na banda, pois logo eles rumariam para o retorno da MK II do Deep Purple, e de cara podemos destacar este disco como o ponto de transição do hard rock com a classe inglesa, inspirado pelo blues, para as formas gradualmente americanizadas dos trabalhos subsequentes, com destaque a “Here I Go Again” e “Crying in the Rain”, duas faixas que ganhariam novas versões no futuro, mas sem a o apelo majestoso das originais.
3. “Slide It In” (1984)
Até aqui a discografia do Whitesnake é irrepreensível, e este é, pra mim, o melhor disco da banda disparado! Creio que muito da excelência do que ouvimos em “Slide It In” vinha do estilo do guitarrista John Sykes, apesar de sua contribuição diminuta na versão norte-americana. Egresso do Thin Lizzy, onde gravou “Thunder And Lightning” (1983), Sykes já havia marcado seu nome nos melhores discos do Tygers of Pan Tang e entrou para Whitesnake após a saída de Mick Moody, no fim da turnê do álbum “Saints And Sinners” (1982).
O estilo visceral de Sykes produzia riffs poderosos e solos cheios de feeling retirados de sua Gibson Les Paul, que casavam perfeitamente com a classe de Mel Galley, e guiavam composições sustentadas pela bateria pesada e perfeitamente timbrada de Cozy Powell. Essa união de estilos permitiu a Coverdale rivalizar em pé de igualdade com o barulho feito pelas bandas norte-americanas de hard rock.
Essa mudança na proposta musical da banda, numa clara tentativa de conquistar o mercado americano, foi a causadora da saída de Moody, apesar dele co-escrever “Slow an’ Easy” e ter registrado algumas da guitarras da versão inglesa do álbum. Já para o mercado norte-americano, Sykes refez as guitarras e Neal Murray sobrepôs algumas linhas de baixo.
Agora bagunçou tudo! Vamos tentar explicar… O contrato com a Geffen Records foi decisivo para enfim o Whitesnake entrar no desejado mercado norte-americano, o que gerou “duas versões” do mesmo trabalho. A história é complicada, mas para resumir, é mais fácil dizer que em janeiro de 1984 saiu a edição inglesa com Micky Moody e o baixista Colin Hodgkinson junto a Mell Galley na outra guitarra e Cozy Powell na bateria.
Com a entrada de Sykes, ele regravou algumas guitarras assim como o baixista Neil Murray, e o disco foi até mesmo remixado por Keith Olson, pois a mixagem original de Martin Birch não agradou a Geffen. A versão norte-americana saiu somente em abril de 1984, três semanas após ser lançado no Japão.
Em “Slide it In” o Whitesnake ainda não abusava das baladas feitas para as ondas de rádio das FMs dos anos 1980, mas conseguia ser melódico ao mesmo tempo que a malícia das influências do blues vinha diminuta e diluída no peso do hard rock.
Quatro composições são provas disto e já valem o disco: a faixa-título, o hard rock acachapante de “Slow an’ Easy”, a balada disfarçada de heavy rock “Love Aint No Stranger”, e a pedrada “Guilty of Love”. A formação presente na edição norte-americana foi uma das mais fortes de toda a história do Whitesnake, tanto que roubou a cena no primeiro Rock in Rio de 1985. Daí para o sucesso no próximo álbum foi só uma questão de ajuste fino da proposta: abandonar de vez os traços de blues e cair definitivamente z no hard rock americano. Mas não foi tão fácil o quanto pareceu!
4. “Whitesnake” (1987)
Os problemas com trocas na formação não pararam com “Slide It In”, disco anterior. O maior sucesso comercial do Whitesnake, a auto-intitulado disco de 1987, padeceu do mesmo mal. Quando o Whitesnake entrou em estúdio para gravar as composições já havia trocado de baterista, com o lendário Aynsley Dunbar (Jimi Hendrix Experience, Mothers of Invention, David Bowie, Journey) no comando das baquetas. Quando saiu do estúdio, John Sykes já havia sido demitido do posto de guitarrista. Não antes de compor alguns dos maiores sucessos da banda e dar uma cara heavy metal às músicas.
Junto com Coverdale, Sykes assina “Give Me All Your Love” e o mega-sucesso “Is This Love”, uma balada que marcou época, tanto nas ondas do rádio quanto no clipe veiculado à exaustão na MTv, e ajudou o disco galgar o posto número 2 do Billboard Hot 200, junto com as regravações de “Here I Go Again” (que também ganhou um clipe e chegou ao 2º lugar nas paradas norte-americanas) e “Crying in the Rain”. Completando o trio de baladas fulminantes, temos “Looking For Love” que consegue ser intensa e fazer muito marmanjo se emocionar.
Porém, o grande trunfo deste trabalho, que seria ignorado no fraco disco subsequente, “Slip fp the Tongue” (1989), são as pontuais remissões ao rock setentista e à sua primeira fase, a mais criativa. Aqui isso vem impresso em “Bad Boys”, “You’re Gonna Break My Heart Again” e, principalmente, em “Still of the Night”, música forte, pesada e épica, com traços hereditários de Deep Purple e Led Zeppelin, e mais uma parceria de Sykes com Coverdale.
Outro ponto de destaque em ‘Whitesnake” (1987) são os teclados de Don Airey, músico convidado numa formação que, além de Sykes, Coverdale e Dunbar, trazia o velho conhecido Neil Murray no baixo. Porém, durante as gravações Coverdale demitiu toda a banda e convocou o guitarrista Adrian Vandenberg para finalizar as linhas de guitarra como músico convidado. O atrito com John Sykes começou quando o guitarrista ameaçou deixar a banda para integrar a reunião do Thin Lizzy.
Na verdade, o clima não era dos melhores à época da gravação deste disco. Além das rusgas com John Sykes, Coverdale sofria de graves problemas de saúde que o levaram a uma cirurgia, e a pressão da gravadora, aliada às inúmeras trocas de estúdio, só tornaram tudo uma bomba relógio.
Para a turnê foi contratado mais um belíssimo time: Adrian Vandenberg e Vivian Campbell na guitarras, Tommy Aldridge na bateria e Rudy Sarzo no baixo. Claro que a formação logo seria alterada novamente. Como o Whitesnake sempre fora centrado na liderança de David Coverdale, essas trocas de formação não foram capazes de minar o sucesso comercial da banda. Não importa o título pelo qual é conhecido, “Whitesnake”, “1987” ou “Serpens Albus”, este disco mudou o Whitesnake de patamar no mundo do rock nos anos 1980.
Na esteira do sucesso de “Whitesnake”, a banda lançaria o próximo disco em 1989, “Slip of the Tongue”, o mais fraco de toda a década de 1980, mesmo com a presença do guitarrista Steve Vai substituindo Vivian Campbell, o que fatalmente mudou o estilo das músicas, pois ele gravou todas as guitarras do disco devido a uma contusão no pulso de Adrian Vandenberg.
Na verdade, era para Steve Vai ter sido convidado a integrar o Whitesnake bem antes, ainda quando John Sykes estava na banda, mas o guitarrista foi contrário e Vai acabou indo parar na banda de David Lee Roth. O grande pecado de “Slip of the Tongue” reside no que fizeram com “Fool For Your Loving”, o grande sucesso do icônico “Ready An’ Willing”, transformada num AOR sem alma, mesma carência das baladas insossas “The Deeper The Love” e “Now You’re Gone”. De bom mesmo, só a épica “Judgment Day”, com algo de Led Zeppelin numa das composições mais pesadas do Whitesnake, quase numa premonição dos próximos passos de David Coverdale.
5. “Good to be Bad” (2008)
Nos anos 1990 o Whitesnake ficou hibernado. David Coverdale embarcou num projeto interessante ao lado de Jimmy Page, o Coverdale/Page, que rendeu um álbum de estúdio em 1993 e até hoje divide opiniões. Após o fraco “Restless Heart” (1997), David Coverdale colocou o Whitesnake num hiato. Esse disco nem era pra ter saído com o nome da banda e sim como um álbum solo do vocalista, mas ele cedeu à pressão da gravadora.
Na verdade ele ainda ofereceu o intimista “Starkers in Tokyo”, uma espécie de acústico gravado no Japão, apenas com Coverdale e o guitarrista Adrian Vandenberg. A banda só seria reativada em 2002, com formação completamente reformulada, e teríamos que esperar mais seis anos anos para ouvir um novo disco de estúdio que seria este “Good to be Bad”, lançado em 2008.
Mantendo a tradição de sempre trabalhar com duplas de guitarras competentes, Coverdale agora tinha como escudeiros Doug Aldrich e Reb Beach, nomes associados a Dio, Lion, Hurricane, Winger e Dokken, com estilos diferentes, mas que se completavam num diálogo interessante.
Isso contribuiu para a renovação da proposta musical do Whitesnake para o novo milênio, claramente tentando uma reaproximação do que faziam nos grandes clássicos dos anos 1980, mesclando o hard rock com a melodia e malícia do blues (como em “Fool in Love”) e do soul. Na verdade, “Till the End of Time” traz até traços de música country, revelando que o novo Whitesnake não queria apenas olhar para o passado.
“Good to be Bad” foi praticamente feito por Coverdale e Aldrich no Pro Tools e contribuem para a excelência das composições os backing vocals de Reb Beach e do baixista Michael Devin. Dá pra perceber que a voz de Coverdale está plenamente amparada pela guitarra de Aldrich que ficaria na banda até 2014 e registraria outro disco, o bom “Forevermore” (2011). Acho que você devia “Good to be Bad” novamente se você acha que ele não merecia estar nessa nossa lista!
Leia Mais:
- Whitesnake | Resenha de “Flesh & Blood” (2019)
- Deep Purple | O Histórico show no California Jam de 1974
- Rainbow | 5 discos pra conhecer a banda de Ritchie Blackmore
- Cozy Powell | 5 Discos Pra Conhecer o Grande Baterista do Classic Rock
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Uma grande banda de um grande vocalista, porém, só curto mesmo a fase ” chapéu e bigode “, ou seja, aquele som calcado
no blues-soul-funk-rock, e vai no máximo até o classudo Slide it in, daí pra cá, sinceramente nunca me desceu !!