Rotting Christ – “Theogonia” (2007) | Você Devia Ouvir Isto

 

Dia Indicado para ouvir: Sexta-Feira.

Hora do dia indicada para ouvir: Meia Noite.

Definição em um poucas palavras: Guitarra, Pesado, Sombrio, Influência de Zeus.

Estilo do Artista: Black Metal.

Rotting Christ Theogonia
Rotting Christ: “Theogonia” (2007/2019 | Cold Art Industry)

Comentário Geral: Inquietude artística sempre foi uma constante, talvez a única além da altíssima qualidade musical na obra do Rotting Christ, uma das mais influentes, criativas e ousadas bandas do metal extremo. 

Sempre transcendendo as normas transgressivas e anti-musicais do gênero radical e ensimesmado a que se dedicava, o black metal, a banda grega liderada pelos irmãos Sakis e Themis Tolis criou uma personalidade forte e uma musicalidade única, capaz de se renovar sem perder a essência. 

Desde o início que oscilava entre o grindcore, o death metal, e o black metal primitivo (uma boa amostra desta fase reside na coletânea “Abyssic Black Cult”, que resenhamos aqui), passando pelo contraste à escatologia norueguesa do black metal no clássico Triarchy of the Lost Lovers” (que resenhamos aqui) e pelas experimentações góticas de “A Dead Poem” (que também resenhamos aqui) e “Sleep of the Angels”, até a volta às raízes na primeira década do novo milênio, o Rotting Christ sempre esteve aberto a expansões de suas fronteiras musicais, buscando a excelência de sua arte e, sem dúvidas, acertando muito mais do que errando.

“Theogonia” é um disco lançado em 2007, e considerado por alguns críticos como um dos melhores da carreira do Rotting Christ, onde, enfim, conseguiram amalgamar todas as múltiplas faces de sua música de forma coesa e homogênea.

Porém, para compreender melhor sua qualidade precisamos voltar um pouco no tempo.

O período experimental do Rotting Christ começou a ser deixado no passado com “Khronos” (2000), um disco melancólico e envolvente, enviesado pelo death metal melódico, proposta continuada em “Genesis” (2002), um álbum que, por sua vez, esboçava o retorno à rispidez e agressividade dos primeiros dois discos (“Thy Mighty Contract” [1993] e “Non Serviam” [1994]) que ouviríamos em “Sanctus Diavolos”, lançado em 2004.

A importância de “Sanctus Diavolos” no processo que leva a “Theogonia” reside no fato de provar que o black metal pode ser inteligente, sem precisar diminuir o peso, a rispidez ou as sombras dos arranjos que oscilavam entre partes agressivas e melodias obscuras.

Porém, “Theogonia” levou isso a um novo patamar, trazendo ao black metal o eruditismo clássico grego através do conceito baseado no poema “Teogonia”, de Hesíodo,

A abertura, com “Χάος γένετο (The Sign of Prime Creation)”, traz o black metal grego do Rotting Christ trajado de gala e levando algumas guitarras com afinação baixa para emoldurar um conceito  intelectual, como também ouviremos em “Helios Hyperion”, com sua passagem groovada de dar torcicolo.

Por aqui já percebemos que peso e velocidade com ferocidade e vulgaridade em meio ao temor e reverência dos climas épicos, situando todo o trabalho  na fronteira entre erudição e o popular, naquele lugar de paixão e fascínio, serão constantes na equação musical.

Existe um perene e grandiloquente sentimento épico, mais evidente, por exemplo, em “Gaia Tellus”, e feito de forma muito criativa, pois reforça que o Rotting Christ não trouxe algo de divino para sua música, pois ela continua profana em sua essência, apesar de multifacetada.

Já em “Nemecic” ouvimos elementos folk e guitarras melódicas em uma composição cujo ritmo beira o tribal em algumas passagens, e o vocal remete ao thrash metal.

Por aí vemos como os arranjos abraçam o conceito, de forma direta e obscura, bem encaixado à personalidade extrema da banda, que ainda usa de artifícios épicos e instrumentos folclóricos gregos para aclimatar ainda mais o tema abordado.

As músicas seguem uma fluidez que confere unicidade, mas se eu tiver que escolher três faixas para representar “Theogonia”elas seriam, simplesmente por expor a variedade musical que aqui ouvimos: “Keravnos Kivernitos” (com ótimas guitarras), “Enuma Elish” (com seu peso sombrio e épico, além dos detalhes de folk em segundo plano) e “Rege Diabolicus” (um black metal por excelência).

Até por isso “Theogonia” é um álbum que deve ser absorvido por inteiro, em suas emoções, ensinamentos e reflexões complementares, também para percebermos os elementos novos que o Rotting Christ trouxe para sua música (como os fortes traços percussivos mediterrâneos que conferem ainda mais agressividade e peso ao disco), com consciência e total controle de sua arte impressa por um ótimo trabalho de estúdio.

Pela primeira vez, Sakis produziu sozinho todo o disco, o que dá ainda mais verdade à música que querem compor, soando como em seus melhores momentos, mas renovado e contextualizado à época em que o disco foi lançado.

“Theogonia” é sim um disco de black metal moderno, mas também uma obra pra quem gosta de prestar atenção em climas e às letras, bem como nos detalhes que enriquecem o metal extremo. Como registrado em “Phobos’ Synagogue” “Threnody”. 

metal extremo, aliás, tem sua parcela guiada pelos riffs que por vezes também remetem ao thrash metal e pelos artifícios do death metal melódico, como podemos ouvir na inspiradíssima “He, the Aethyr”, que com seu peso e agressividade se torna a melhor composição do trabalho.

Aproveite que a Cold Art Industry acaba de relançar esse álbum aqui no Brasil com qualidade de importado e arte gráfica antes exclusiva para a versão em LP, e vá atrás deste disco indispensável do metal moderno!

Ainda ficou alguma dúvida de que VOCÊ DEVIA OUVIR ISTO?

Ano: 2007

Top 3: He, the Aethyr, “Helios Hyperion” e “Enuma Elish.

Formação: Sakis Tolis (guitarras, teclados e vocais), Themis Tolis (bateria) e Andreas Lagios (baixo)

Disco Pai: Dimmu Borgir  “Enthrone Darkness Triumphant”  (1997).

Disco Irmão: Bal-Sagoth “The Chthonic Chronicles” (2006).

Disco Filho: Meneapneontes – “Promachos” (2015)

Curiosidades:  O poema de Hesíodo narra o mito cosmogônico da origem do mundo  pelo prisma da mitologia grega (com deuses, homens e heróis) e de outras obras clássicas que orbitam o mesmo tempo. Junto a Homero, Hesíodo foi responsável, como nos conta Heródoto, por “dar nomes aos Deuses, distinguir-lhes honras e artes, e indicar suas figuras”.

Pra quem gosta de: Música extrema, cosmogonia, Mitologia Grega, e “A Divina Comédia”.  

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