“Mandylion”, clássico terceiro disco de estúdio da banda THE GATHERING, é nossa indicação de hoje na seção VOCÊ DEVIA OUVIR ISTO, cuja proposta você confere nesse link.
Definição em um poucas palavras: pesado, arrastado, melódico, poético, atmosférico, influenciador.
Estilo do Artista: Atmospheric Doom Metal
Comentário Geral: “Mandylion” foi não só o disco responsável por trazer a vocalista Anneke van Giersbergen como novidade, mas também foi o ponto crucial da transição do death/doom do início do The Gathering para a ousadia experimental e progressiva que ouviríamos em seus discos à partir da segunda metade dos anos 1990.
Formado em 1989, na Holanda, rapidamente o Gathering se tornou a banda de maior expressão em seu país, graças a discos como “Nighttime Birds” (1997) e “How to Measure a Planet?”(1998), que levaram-os a um patamar elevado dentro metal europeu.
Porém, esse sucesso começa no disco “Mandylion”, lançado em 1995, que trazia como trunfo os vocais da fantástica cantora Anneke Van Giersbergen emoldurados por um doom metal de tonalidades épicas e texturas valvuladas.
Sobre o motivo de escolherem uma mulher para os vocais principais, o guitarrista René Rutten explicou, em uma entrevista da época, que: “simplesmente não conseguíamos mais encontrar um bom vocalista masculino”
Em seguida, ele contava como chegaram até Anneke:
“Durante um show eu encontrei Anneke onde ela e seu namorado estavam se apresentando, ele na guitarra e ela nos vocais. Eles tocavam jazz ou versões cover de Frank Zappa. Eu a ouvi cantar e perguntei se ela gostaria de fazer um teste com uma de nossas músicas. Ela fez, e desde então é a vocalista do The Gathering. E como ela já havia cantado em uma banda de speed metal antes, ela também sabia como lidar e trabalhar com esse tipo de música como cantora.”
A chegada de Anneke Van Giersbergen permitiu à banda explorar uma face mais limpa dos cânones do doom metal, olhando para pioneiros como Candlemass, Trouble, e Black Sabbath e inserindo seu legado de peso chapado numa proposta moderna, de timbres crús e agressivos usados por Paradise Lost, Anathema e Katatonia, junto a uma base de teclados e pontuais efeitos que envolviam toda essa musicalidade numa vibração ethereal/darkwave.
Ou seja, as adaptações na fórmula iam além dos vocais, pois, ao mesmo tempo que a nova vocalista abria possibilidades no horizonte musical, o sexteto que compôs e gravou “Madylion” inseria uma dose generosa da melancolia do gothic rock em meio a toda a densidade de seu DNA no doom metal, que ainda era esfumaçado por uma psicodelia sessentista que não tinha virado moda.
Até por isso, “Madylion”, ao meus ouvidos, é uma fusão de Anathema, Paradise Lost e Candlemass com Cocteau Twins, Fields of the Nephilim e Dead Can Dance.
Nesse sentido, este terceiro álbum de estúdio transformava o Gathering de uma banda de death/doom metal comum – que pode ser conferida em discos como “…Always” (1992) e “Almost a Dance” (1993) – num modelo moderno de heavy metal que seria seguido por diversas outras bandas na próxima década.
Pode-se dizer que “Mandylion” olhou para o doom metal por um prisma diferente, trazendo algo de renovador para os riffs marcantes e a atmosfera depressiva tão característicos da transformação gótica que o estilo começava a experimentar na primeira metade dos anos noventa.
As duas faixas de abertura de “Mandylion”, “Strange Machines” (uma das melhores músicas da banda) e “Eléanor” (com mais determinação e um detalhe na linha de baixo inspiradíssimo) mostram exatamente isso, sendo dois grandes clássicos do Gathering que resumem a proposta melancólica, arrastada, pesada, e depressiva que é tão atraente ainda hoje.
Afinal, nada neste disco soa datado e olhando em retrospecto é compreensível o motivo pelo qual essa fórmula de doom metal com vocais femininos explodiu: o atrito de opostos criava musicalmente o mesmo efeito envolvente que o contraste de sensualidade e terror da literatura gótica dos séculos XVIII e XIX.
Obviamente, o Gathering nunca foi uma banda de aspectos sinfônicos, pompa épica e vocais líricos em contraste ao gutural, mas é inegável que a iniciação destas bandas com vocais femininos se deu com a chegada de “Mandylion” e também do auto-intitulado primeiro álbum do Theatre of Tragedy.
Na verdade, o Gathering já tinha essa ideia de levar a proposta apresentada pelo Paradise Lost em “Gothic” (1991) e “Icon” (1993) a um novo nível, pois antes mesmo de Anneke entrar na banda em 1994 e mudar seus rumos, eles já trabalhavam combinando discretamente os vocais femininos de Marike Groot com vocais masculinos em seus dois primeiros discos.
“Almost a Dance”, de 1993, por exemplo já dava indícios do que apresentariam em “Mandylion” mas faltava algo que desse o brilhantismo final à musicalidade do The Gathering; faltava aquela sensibilidade positiva e refinada em cada detalhe (que percebe-se, por exemplo, em “In Motion #2”).
“Mandylion” ainda tem a característica de ser um álbum compacto, como se fosse dividido em partes de uma única composição que fala sobre uma perda irreparável, algo que as viagens experimentais dos discos seguintes não permitiriam mais.
Até por isso e pela maturidade atingida, não dava pra colocar o Gathering, nesse momento de sua discografia, no mesmo balaio da bandas lançadas pela Century Media à época, como Moonspell, Theatre of Tragedy, Samael e Tiamat.
Afinal, “Mandylion” é diferente de tudo o que era lançado por estas bandas, à começar pelo fato de que, amparado por momentos como “In Motion #1” e “Sand and Mercury”, este é um disco que trazia mais luz do que trevas para aquela era obscura do metal tomada pelo ensimesmado extremismo da segunda geração do black metal.
Prestando atenção aos detalhes, vemos que algumas camadas de teclados e desdobramentos melódicos até parecem mantras e vibrações usados em exercícios de relaxamento e meditação, como na experimentação imersiva e cinematográfica da própria faixa-título.
Além disso, os toques de gothic rock e de rock alternativo em faixas como “Leaves” e “Fear the Sea”, mostram que René Rutten já tinha em mente que eles estavam se equilibrando entre o metal e o rock.
Tanto que quando perguntado sobre o estilo da banda à época ele respondeu: “Às vezes é metal, às vezes é mais rock. Mas certamente ainda temos algumas influências de heavy metal que você também pode ouvir no álbum.”
Ele conclui a resposta mostrando que o plano para o futuro seria realmente explorar e experimentar ao máximo essa liberdade musical: “Talvez no futuro a gente avance um pouco mais para o Metal de novo, quem sabe? Ou talvez sejamos mais pop também. Com a voz de Anneke, podemos realmente nos desenvolver em qualquer direção.”
O que a história nos diz é que “Mandylion”, disco gravado e mixado no Woodhouse Studios, na Alemanha, sob a tutela de Siggi Bemm e Waldemar Sorychta, seria lançado pela Century Media e venderia dezenas de milhares de cópias em todo o mundo, sendo um dos últimos álbuns verdadeiramente dentro do espectro musical do heavy metal por parte do Gathering.
Aproveite que este disco foi relançado numa limitadíssima tiragem de 300 cópias pelo selo Shinigami Records em parceria com a Century Media e vá atrás deste clássico noventista.
Ano: 1995
Top 3: “Strange Machines”, “Eléanor”, “Sand and Mercury”.
Formação: Anneke van Giersbergen (vocais), René Rutten (guitarra e flauta), Jelmer Wiersma (guitarra), Frank Boeijen (teclados), Hugo Prinsen Geerligs (baixo), Hans Rutten (bateria, e percussão).
Disco Pai: Anathema – “Serenades” (1993)
Disco Irmão: Theatre of Tragedy – “Theatre of Tragedy” (1995)
Disco Filho: Autumn – “My New Time” (2007)
Curiosidades: O termo mandylion é uma palavra do grego medieval que, na Igreja Ortodoxa, se refere ao que para nós ocidentais corresponde a imagem marcada no Santo Sudário. Essa palavra não é usada em nenhum outro contexto religioso e dialoga com o trabalho gráfico de disco do The Gathering que empresta o termo como título.
Pra quem gosta de: mulheres no comando, profundidade, literatura, psicodleia e metamorfoses.
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