Antes de mais nada, para que não haja nenhuma dúvida quanto a minha posição neste texto, deixo claro ser “O Evangelho Segundo Hitler” o melhor dentre o livros que li este ano.
Sei que o ano ainda está apenas um pouco adiante de seu ponto médio, mas dificilmente alguma outra obra irá me impactar deste modo pelos próximos dias que se seguirão em 2015.
Apesar de ser um entusiasta das listas infames, nunca elaborei um “top ten” para minhas obras literárias favoritas (já me foi hercúleo o trabalho de enumerar 20 discos favoritos na vida, que declinei em todos os outros desafios), mas, hoje, com a certeza fulminante de uma solução matemática, esta obra estaria entre os 10 enumerados!
Em suma, eis aqui uma “resenha” de um admirador, um simples leitor que não se apega em técnicas de crítica literária. Todas as palavras aqui expostas são reações imediatas ao impacto positivo do livro.
Isto posto, vamos a “O Evangelho Segundo Hitler”.
Rogo ao leitor que se familiarize com esta nova onda da literatura nacional isenta dos cacoetes que relegaram os clássicos autores tupiniquins aos círculos acadêmicos (pois para as gerações mais novas, os autores nacionais se viam em mimetismos artísticos “machadianos” que atraíam somente os seus iguais, deixando um grande público de leitores se esbaldarem nos prazeres literários dos best sellers internacionais), da qual Marcos Peres é um forte integrante.
Cabe aqui, antes das minhas impressões acerca do título, uma “sinopse” que não adianta fatos, mas que nos fornece uma panorama em preto-e-branco da mirabolante e colorida visão alternativa da realidade que o autor nos apresenta.
No site da editora temos as seguintes palavra:
“Este é um romance notável de um leitor obcecado por Jorge Luis Borges a ponto de imputar-lhe uma infâmia que nem o próprio teria inventado: a de ter engendrado, com sua imaginação infernal, o fermento profético que possibilitou Adolf Hitler e o nazismo. O evangelho segundo Hitler faz aquilo que o borgiano Pierre Ménard fez com o Quixote de Cervantes: reescreve produzindo diferença.”
Desde o pontapé inicial com a palavra “não”, até o fim da obra com o palavra “medo”, o autor caminha uma trilha perigosa, estreito e sempre ladeada pelo precipício do ridículo.
Entretanto, com a destreza de poucos e sua corajosa narrativa, Marcos Peres consegue passar incólume ao precipício que seria fatal para uma boa parcela de escritores já renomados, atingindo o fim do caminho com louvores.
Este sucesso se deve ao fator linear da narrativa, sem o ribombar costumeiro dos momentos de tormenta (aqui os sequestros são sem alarde e as agressões físicas parcas e veladas), fazendo com que sua versão insólita da realidade nos seja apresentada de um modo fluido, poucas vezes vista por este que vos escreve.
Façamos um paralelo com a música.
Pense nesta obra como uma peça da música clássica, não como A Cavalgada das Valquírias, de Richard Wagner, mas um pouco mais próxima do Quinteto em Lá Maior, “A Truta”, de Franz Schubert. É esta fluidez recheada de sensibilidade latente que faz o insólito se tornar verossímil.
Este é o momento diferencial desta obra frente as demais que investem em teorias conspiratórias. Uma boa teoria da conspiração constrói suas bases em fatos para elaborar uma tese que foge à nossa realidade, em geral, nos apresentando um prato mais saboroso do que o oferecido pela a história real.
Entretanto, em sua maioria, tais teorias precisam de uma guinada descontínua em suas hipóteses, geralmente encobertas pelas maravilhas das novas possibilidades em aberto, ou se valendo de momentos de ação de tirar o fôlego.
Este salto descontínuo não se faz presente na obra de Marcos, um autor que se mostrou um exímio alfaiate das coincidências de habilidade ímpar com a agulha do acaso, pois costurou magnificamente elementos tão díspares, de modo tão conciso e casual, que ao final da obra me peguei pensando: “Sabe o que mais? Poderia ter ocorrido assim!”
Mesmo no momento mais “estapafúrdio” (como bem diz na orelha na obra) que envolve um homônimo de Jorge Luis Borges, Hitler e a lança do destino, somos impelidos a concordar que se as outras hipóteses foram aceitas, a tese apresentada é plausível. Talvez pelo pouco alarde em momentos emocionantes, esta “tese” se estabeleça não pela força, mas pela persuasão.
Claro que “O Evangelho Segundo Hitler” não é um livro desejoso em mostrar uma versão secreta dos fatos, como tentaram fazer autores como Michael Baigent e Richard Leigh. É somente um exercício corajoso para o autor e delicioso para o leitor.
Neste momento, podemos nos valer (claramente em contextos opostos) das palavras escritas pelo matemático George Cantor, em carta a seu amigo Dedekind, após demonstrar uma controversa tese sobre o infinito: “estou vendo, mas não acredito”.
Extrapolando as “novas teorias” históricas, uma frase do personagem central, embasada no contexto da obra, nos açoita impiedosamente. Ao proferir que “todo o cerne da justificativa intelectual do nazismo é tão torpe aos olhos do descrente”, o autor lança mão de seu último lema para demonstrar sua tese: o nazismo nasceu de um efeito borboleta com ponto inicial em um conto de Jorge Luis Borges e ativado pelo coração apaixonado de um “outro” Jorge Luis Borges.
A cadência em meio ao romance é tão envolvente que só nos damos do delicioso absurdo que nos diverte quando atingidos por esta verdade.
Pois, se todo “O Evangelho Segundo Hitler” é uma obra de ficção, esta frase certamente brilha como uma análise da versão real dos fatos, pois, apesar da fantasia das teorias da Terra Oca e Os Protocolos dos Sábios de Sião, os demais elementos como a Sociedade Thule, os Ofitas, Jorge Luis Borges, os nazistas e seu misticismo, além das mentiras por amor, são todos elementos reais.
Bem utilizados pelo autor, estes elementos nos oferecem uma naturalidade narrativa através da soma de absurdos “perpetrada pelo destino” (cuja existência é discutível), culminando em um desfecho plausível, como uma ordem advinda do caos.
Mas o que é o destino senão um harmonizador de coincidências? Neste contexto, o autor se faz o destino e esta obra é sua própria exploração da harmonia pré-estabelecida de Leibniz, mas aqui casada com um pouco de filosofia ofita.
Ao fim, somos agraciados com uma leitura deliciosa, numa primeira obra de um autor que desfila muito talento e tem um futuro promissor dentro da literatura nacional (seu segundo trabalho, Que Fim Levou Juliana Klein?, acaba de ser lançado).
Antes de finalizar, meu apreço por universos paralelos me faz indagar se, na verdade, este universo criado por Marcos não seria um terceiro, pois ao findar das páginas encadernadas me encasquetei com a pergunta de quais eram os Borges reais por detrás de tão estapafúrdia teoria?
Ainda não consegui uma resposta, mas um certeza eu tenho, muito além da teoria conspiratória em primeiro plano, “O Evangelho Segundo Hitler” é um livro sobre os sentimento humanos e suas consequências.
Por isso tudo, você devia ler esta obra!
Leia Mais:
- RESENHA | “Quem Fim Levou Juliana Klein?”, de Marcos Peres
- UMBERTO ECO | 3 Livros Pra Conhecer
- HERMANN HESSE | 3 Livros Pra Conhecer
- Gabriel Garcia Márquez – “Crônica de uma morte anunciada” | CLÁSSICO DA LITERATURA
- RESENHA | Paulo César Pinheiro – “Matinta, o Bruxo”
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