Enslaved – Resenha de “Utgard” (2020)

 

Sempre aguardo com ansiedade um novo trabalho do Enslaved e com “Utgard”, seu décimo quinto disco de estúdio, não foi diferente.

Com o disco anterior, “E” (2017- confira a resenha aqui), o Enslaved usou a maturidade para amalgamar o minimalismo melancólico ao orgástico progressivo.

Essa ousadia digna de exploradores musicais continua em “Utgard”, onde eles oferecem mais uma dose de seu metal progressivo dotado de interseções fartas e óbvias com o metal extremo.

Nesse escopo, temos experimentações nos arranjos, tanto no que tange ao peso e a velocidade quanto nas texturas e nas timbragens.

Enslaved - Utgard (2020, Nuclear Blast, Shinigami Records)
Enslaved – “Utgard” (2020, Nuclear Blast, Shinigami Records)

Eu costumo dizer que o Enslaved se tornou uma mistura de King Crimson com Neurosis, variando nos últimos quatro discos de acordo com os quatro elementos alquímicos.

Na minha ótica, “RIITIIR” (2012) corresponde ao elemento terra, “In Times” (2015) ao elemento fogo, “E” ao elemento água, e agora, “Utgard” (2020), parece fechar o ciclo com o elemento ar.

Claro que isso é uma impressão minha, não existe nenhum conceito, de fato, e demoraria muito para explicar o significado de cada elemento amarrado à cada disco citado que gera essa minha impressão.

Desta forma, vamos ao disco!

Se o conceito alquímico/elemental é particular, não ha como deixar de mencionar que a cultura nórdica seja um conceito universal dentro da obra do Enslaved, e com “Utgard” não é diferente.

Na mitologia nórdica, Utgard é um castelo em Jotunheim, residência dos gigantes, por consequência associado ao lar dos demônios, o final dos três mundos conectados a Yggdrasil.

Até por isso, tudo por aqui é conceitualmente muito simbólico e combina com a música que fazem, experimentando fundir o progressivo setentista com o black metal moderno pelo fogo da mitologia.

Logo, “Utgard” é consequentemente um disco disco obscuro e sombrio, como revelam as ótimas “Fires in the Dark” (que abre  disco com pegada folk em meio a arranjos multivariados), “Jettegryta” (uma genial e muito própria mistura de Bathory com King Crimson), “Storms of Utgard” (outro grande destaque do disco) e “Distant Seasons” (revelando influências progressivas do Marillion).

Tudo bem que a cada novo disco eles se distanciam um pouco mais de suas raízes no black metal e aqui existem descidas pontuais ao terreno do rock no que diz respeito ao peso.

Isso pode ser percebido em “Homebound” (com algo de hard rock diluído discretamente em sua fórmula ) e “Distant Seasons”, que é basicamente um prog rock moderno e me ajudará a não ficar surpreso se o Enslaved seguir o caminho do Opeth nos próximos discos, se rendendo a recriar o rock progressivo setentista..

O Enslaved é aquela banda que sabe o potencial libertador dos excessos, mesmo que agora nos ofereça-os de uma forma direta, em músicas menores, bem equilibradas no atrito de opostos.

Nesse sentido, vocais agressivos se intercalam com vocalizações limpas, riffs pesados convivem com camadas de climas, e desenvolvimentos progressivos se sobrepõem à intensidade do black/viking metal, nos oferecendo músicas primorosas como “Flight Of Thought And Memory”.

Com isso, os circunlóquios musicais periódicos diminuíram, abrindo espaço para os derramamentos expressivos compactados, com forma e conteúdo sempre em constante atrito, como ouvimos em “Sequence” (uma das melhores do disco, onde o Enslaved soa como o paralelo black metal do Opeth) e na psicodélica “Urjotun” (mostrando que o New Order e o Kraftwerk pode ser também influências da banda).

De certo modo, não seria exagero dizer que aqui ouvimos algumas remissões ao seu passado musical, em especial aos discos da trinca genial “Isa” (2004), “Ruun” (2006) e “Vertebrae” (2008).

Cabe mencionar que “Utgard” traz uma novidade na formação que é o baterista Iver Sandøy, o substituto de Cato Bekkevold.

Em suma,“Utgard” é uma ótima opção para quem gosta de uma música complexa, sofisticada e instigante.

FAIXAS:

1. Fires In The Dark
2. Jettegryta
3. Sequence
4. Homebound
5. Utgardr
6. Urjotun
7. Flight Of Thought And Memory
8. Storms Of Utgard
9. Distant Seasons

FORMAÇÃO

Ivar Bjørnson (guitarra, teclados, efeitos e backing vocals)
Grutle Kjellson (vocal, baixo e teclado)
Arve Isdal (guitarra e backing vocals)
Håkon Vinje (teclados, piano e vocais)
Iver Sandøy (bateria, percussão, teclados, efeitos e vocais)

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