Autoramas – Resenha de “O Futuro dos Autoramas” (2016)

 

“O Futuro dos Autoramas” é o novo – e sétimo – trabalho da banda Autoramas, promovendo todas as suas qualidades musicais em roupas novas e modernas.

Senhoras e senhores!

É com imensurável prazer e estupefata contemplação que apresentamos a transmutação do Autoramas no mais novo supergrupo do rock nacional!

Pode soar exagerado, mas é exatamente esta a condição da atual formação da banda, que caminha rumo às duas décadas de existência com firmeza dentro da boa música e renome dentro do underground.

Acompanhando Gabriel Thomaz (voz e guitarra), temos a cantora, compositora e guitarrista Érika Martins (Penélope e carreira solo), o baterista Fred (Raimundos, Supergalo e Érika Martins) e o baixista/vocalista Melvin (Carbona, Lafayette & Os Tremendões e Acabou La Tequila, essa última, uma das bandas mais originais da safra noventista), união que arrebatará certamente os corações roqueiros que experimentaram os alternativos anos 1990.

O Futuro dos Autoramas (2016)
Autoramas: O Futuro dos Autoramas (2016, Hearts Bleed Blue Records)

A receita de rock sessentista, new wave e Jovem Guarda, foi acrescentada de um tempero mais punk aqui, doses de indie (mas longe do padrão choroso e pedante dos nomes modernos) acolá, sendo tudo misturado com bastante melodia e refrões cativantes.

Por falar em cativante, este adjetivo se torna indissociável desta nova empreitada, consequência direta da presença de Érika Martins.

Sua performance traz desenvoltura melódica e linhas vocais hipnóticas, sendo impossível passar incólume a seu canto sirênico.

Num contexto geral, o rock com ecos do passado apresentado nos últimos álbuns, principalmente no ótimo “Música Crocante” (2011), vem reformulado, quase imerso numa distopia futurista musical, um pouco mais monocromática e cinzenta, mas não menos divertida que outrora, desfilando muita maturidade em canções inteligentes.

São ótimos exemplos desta abordagem, faixas diferenciadas como “Quando a Polícia Chegar” (que garante a diversão num power pop de solo criativo e backing vocals grudentos), “Rolo Compressor” (com efeitos e aclimatação futurista em um arranjo que me parece uma mescla descolada e inusitada de Ramones com Kraftwerk) e ” A Sua Vida Até Aqui” (que lembra levemente o New Order nas pinceladas de pos-punk inglês).

Para a alegria dos fãs, as guitarras continuam bebendo nas fontes primordiais do rock n’ roll, enquanto a cozinha permanece tão pulsante como outrora, mostrando que as novas peças da engrenagem estão bem azeitadas e encaixadas com a estrutura original, refletindo arranjos que investem em mais texturas diferenciadas, o que nos oferece um álbum muito mais rico dentro do já alto padrão de qualidade do Autoramas.

Faixas como  “O Que Você Quer” (com suas altas doses de rock alternativo, baixo proeminente e ecos de grunge sombrios), “Demais” (com vocal delicado em contraste ao instrumental mais denso e sujo) e “Jet To The Jungle” (com atitude visceral e letra perspicaz) evidenciam que o rock n’ roll ainda impera no presente do Autoramas.

Algo que salta aos ouvidos logo na primeira audição é o caráter austero de algumas canções, principalmente em “Problema Seu” (cadenciada, quase uma versão retro-futurista do passado do Autoramas, com menos neon e mais adornos eletrônicos) e “Verão” (com melodias melancólicas com um pé no western/steampunk, deitadas em camas de teclados e entrecortadas por backing vocals apaixonantes), além dos covers para “Be My Baby” (que quase virou uma balada de clima garage), das Ronettes, e “Garotos II” (faixa-bônus, que retoma antiga sonoridade da banda, pura e sem gelo), do Leoni.

Todavia, o melhor foi deixado para o final com a sensacional faixa instrumental “Telecatch”, dotada de arranjos de guitarra que dariam orgulho a Chuck Berry, além de um ritmo contagiante que empolgaria até mesmo John Travolta e Uma Thurman numa certa cena, de um certo filme, de um certo Quentin Tarantino, que marcou a década de 1990.

O álbum foi produzido pela própria banda e Lê Almeida, com masterização e mixagem  à cargo do renomado Jim Diamond, quem tem suas impressões digitais em álbuns de nomes como Sonics, White Stripes e Dirtbombs.

O altamente destacável projeto gráfico é assinado por Paulo Rocker e, no Brasil, o disco será laçado via Hearts Bleed Blue.

Nas palavras de Gabriel Thomaz, “este é o disco mais bem acabado do Autoramas e marca o início de uma nova fase, por isso o nome ‘O Futuro dos Autoramas’”.  

Duvido muito que após a audição deste excelente trabalho consiga refutar o argumento de Gabriel, a mente responsável por esta que é uma das melhores bandas nacionais em atividade nos dias de hoje, que nos apresenta, quiçá, seu melhor álbum da carreira.

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