RESENHA | Rino Gissi – “Death By Metal: A História de Chuck Schuldiner e do Death”

 

“Death By Metal: A História de Chuck Schuldiner e do Death” é exatamente o que o título diz: uma biografia daquele que é considerado o mentor intelectual de uma das principais formas do metal extremo.

Você pode até discutir se o Death é a banda que inventou o death metal, como muitos o fazem e com argumentos válidos, mas não dá pra ignorar o fato de que Chuck Schuldiner levou o afluente extremo do heavy metal a patamares elevados de musicalidade, mensagem e abordagem.

Havia agressividade no Death, mas também uma indignação para com os outros estilos dentro do heavy metal presos a clichês enquanto o mundo estava cheio de conflitos étnicos, sociais e políticos, ou até mesmo das mais mórbidas questões que se escondem na mente humana.

O Death abraçou o lado da mente humana.

Seu início se dá com o Mantas, no ano de 1983, sendo que muitos críticos musicais colocam as suas primeiras demos como o advento do death metal.

Porém, como qualquer estilo musical, o death metal não começou por uma banda só. Ele é fruto de um processo de desenvolvimento natural e do incosciente coletivo que compartilha as mesmas ideias em mentes diversas.

Junto a Chuck Schuldiner estão como pioneiros do estilo Thomas Gabriel Fischer do Hellhammer/Celtic Frost e Paul Speckmann do Master, além de bandas como Morbid Angel e Possessed, apenas para citar alguns nomes que levaram as propostas de Slayer, Venom e Kreator a um patamar ainda mais brutal e agressivo.

Rino Gissi - Death By Metal A História de Chcuck Schuldiner e do Death

“Death By Metal: A História de Chuck Schuldiner e do Death”

Este livro de Rino Gissi, lançado no Brasil pela editora Estética Torta (num excelente acabamento diga-se), vai deixar toda essa história bem clara, apesar de ser um livro indicado para iniciantes na trajetória e na música do Death.

Aqui está o primeiro ponto que quero abordar nessa resenha: esta é uma biografia que não se aprofunda em fatos, conflitos e relacionamentos entre os músicos, nem no comportamento idiossincrático de Chuck Schuldiner.

Aliada à escrita fluida e direta, tipicamente jornalística de Gissi, essa objetividade acaba tornado a leitura mais fácil, tanto que você consegue ler esse livro tranquilamente em um dia se estiver dedicado apenas à sua leitura.

Fica sensação de que você está lendo um seção de biografias de uma revista especializada, intercalada por resenhas (recheadas de adjetivos comuns e esser periódicos nichados no heavy metal) de cada um dos álbuns e análises das letras (um fator importante para entender a evolução do Death ao longo do tempo).

Aliás, os excertos das letras e suas traduções estão dando suporte à análise de como Chuck Schuldiner amadureceu junto com a sonoridade de sua banda.

Estas passagens que analisam pedaços das letras de algumas músicas talvez sejam os únicos pontos do livro onde se discute Chuck Schuldiner além da narrativa jornalística, dando rápidos mergulhos nos conflitos naturais e pessoais de um artista que era a referência máxima em seu estilo.

UM GÊNIO INSTÁVEL

O livro mostra um Chuck que oscilava entre a arrogância inerente à forma de enxergar sua música e o sentimento de injustiça em ser reconhecido mais pelos conflitos que sua personalidade forte gerava do que pela música provocativa que criava.

Chuck Schuldiner queria levar o Death a estágios cada vez mais altos, sempre à frente do seu tempo, mas encontrava reações e críticas que não compreendia e com as quais não lidava muito bem.

Os sentimentos gerados por esse efeito ação-reação, como revanchismo e rancor quase paranóicos e esquizofrênicos, fruto de uma mente que não consegue reconhecer os próprios erros, são confessados nas letras de Chuck, como dito antes, uma das poucas vezes que o texto foge da objetividade jornalística.

No livro, a lista de adjetivos dados a Chuck por nomes ligados à sua biografia de alguma forma vão de genial, focado e talento raro, para instável, arrogante, e egoísta.

A verdade é que Schuldiner era um artista avesso a estereótipos, sempre buscando a vanguarda e não media consequências ou calculava os preços dessa conduta.

Nesse sentido Rino Gissi foi eficiente ao ampliar o significado de cada momento de Chuck como um artista inserido num mercado fonográfico selvagem e com pouco espaço para a arte, mas sim preocupado com repetições de fórmulas vendáveis.

Por motivos óbvios a parcela que mais prende no livro é justamente a mais triste e reveladora.

A narrativa da morte de Chuck escancara nas entrelinhas como os sentimentos nutridos por ele foram tóxicos para sua saúde e como o capitalismo pode ser cruel quando se tem uma doença grave, de tratamento caro, mas sem condições financeiras num país sem assistência médica pública.

MAIS ACERTOS DO QUE ERROS

No geral, a simplicidade e a objetividade na exposição das informações desta biografia acabam tendo seus pontos negativos e positivos.

Essa será a tônica dessa publicação: acertos convivendo com problemas.

Por exemplo, a tradução foi certeira em trazer referências e expressões populares para a realidade do público brasileiro, mas a revisão deixou passar pontos incômodos, sendo que alguns parecem herdados de alguma edição portuguesa (como a palavra “humidade”, que não está errado, mas para nós, no Brasil, é escrita sem o “h”).

Mesmo assim, o saldo final é extremamente positivo.

O STEELY DAN DO DEATH METAL

Outro ponto importante nesse contexto é que Rino Gissi deixa claro que após a fatídica turnê do Death pela Europa sem Chuck, a banda passa a ser uma espécie de projeto solo do guitarrista/vocalista.

Claro que a seu lado estavam parceiros musicais importantes, como o baixista Steve DiGiorgio e o baterista Richard Christy. Até mesmo o empresário Eric Greif é uma peça importante na evolução do Death apesar dos atritos com Chuck.

“Alguma coisa deve haver de errado com o líder quando uma banda troca de músicos tantas vezes”. Estava palavras ditas por  Jim Welch, reponsável pela Combat Rock estã registradas no livro antes de percebermos que a cada novo passo Chuck buscava por uma formação capaz de colocar suas ideias musicais em prática.

O próprio escritor levanta a hipótese de Chuck ter conscientemente tomado a decisão de “fazer do Death uma espécie de projeto pessoal, em vez de uma banda de verdade, contratando músicos de acordo com as necessidades e situações e permanecendo como o único membro fixo.”

Por isso, em uma das notas que fiz sobre o livro comparei Chuck à dupla Donald Fagen/Walter Becker, que eram o centro do Steely Dan e a cada álbum buscavam músicos para desenvolver sua ousada forma de jazz rock.

Até pelas aspirações progressivas e jazzísticas que o Death alimentou à partir de “Human”, creio que colocar o Death como o Steely Dan do death metal não seja tão distante da verdade (muito menos pejorativo, pelo contrário) e encontre um paralelo para o perfeccionismo e esmero que Chuck buscava para o heavy metal como um todo.

O próprio Eric Greif, em declaração registrada no livro, afirmou que Chuck tinha conscientemente tomado essa atitude, para garantir o poder de decisão empresarial do Death somente centrada nos dois.

Para completar a comparação, assim como na banda liderada por Becker/Fagen, os discos do Death, com o passar do tempo, vão ficado cada vez mais requintados e complexos e se tornaram referência de alta classe dentro da música pesada.

O LIVRO VALE A PENA?

Muito!

Principalmente se você é daqueles que gosta de ler sobre rock/metal, colecionar artigos das bandas além dos discos e, principalmente, aprecia leituras rápidas com apenas a informação necessária encapsulada em menos de duzentas e cinquenta páginas.

Além disso, é necessário enaltecer o trabalho da editora Estética Torta no quesito acabamento e escolha do material. O cuidado já começa na capa dura com letras em alto relevo e se estende para o papel de excelente qualidade (sem brilho) e impressão limpa.

Infelizmente, parece ser um livro já difícil de encontrar, mas se você gosta de heavy metal acho que deveria fazer um esforço e ir atrás.

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