Música Brasileira: 21 discos para conhecer os “compositores malditos” da MPB

 

Descubra os compositores malditos da música brasileira que você precisa conhecer através de 21 discos essenciais. Esses artistas foram ignorados pela indústria por razões diversas, mas suas obras são verdadeiras joias da música brasileira.

A música brasileira é rica em talentos, mas nem todos os artistas receberam o reconhecimento que mereciam em suas épocas. Conheça, neste artigo, uma lista com os discos essenciais dos compositores chamados de “malditos” da música brasileira, cujas obras foram ignoradas pela indústria, mas que são verdadeiras joias da cultura musical do país.

Descubra os compositores malditos da música brasileira que você precisa conhecer através de 21 discos essenciais. Esses artistas foram ignorados pela indústria por razões diversas, mas suas obras são verdadeiras joias da música brasileira. A música brasileira é rica em talentos, mas nem todos os artistas receberam o reconhecimento que mereciam em suas épocas. Conheça, neste artigo, uma lista com os discos essenciais dos compositores chamados de "malditos" da música brasileira, cujas obras foram ignoradas pela indústria, mas que são verdadeiras joias da cultura musical do país.


4 Melhores Discos de Compositores que Parecem, Mas não são Malditos

  1. Raul Seixas – “Krig-Há, Bandolo!”
  2. Belchior – “Alucinação”
  3. Tim Maia – Tim Maia
  4. Moacir Santos – “Coisas”

Quem são os compositores malditos da Música Popular Brasileira?

Os compositores “malditos”, ou simplesmente os “malditos”, da MPB eram um grupo de artistas surgidos na virada para a década de 1970 que praticavam uma espécie de contra-cultura musical no Brasil, indo de encontro ao padrões populares do momento, com muito experimentalismo musical e temas espinhosos numa época de ditadura militar e censura cultural.

À partir dos grandes festivais de música brasileira nas décadas de 1960 e 1970, emergiu esta ramificação da MPB que misturava tendências, estilos e propostas, pelas mãos de compositores criativos, ousados e destemidos, que mergulhavam suas composições num pouco mais de experimentalismo, criando uma formatação tão genial quanto anticomercial.

Inovadores e poéticos, estes compositores ganharam espaço nos festivais de música, pois geravam audiência pelo fator instável do inusitado – que poderiam gerar cenas como a antológica de Sérgio Ricardo no III Festival da Canção de 1967, com a canção “Beto Bom de Bola”, onde ele bardava ao público alienado: “Vocês não estão entendendo nada”. E por mais que não fossem compreendidos, estes compositores construíram e desconstruíram linguagens musicais, sempre indo de encontro às tendências normativas e comerciais, e aqueles que sobreviveram aos primeiros tempos dos festivais, foram batizados de malditos da M.P.B.

À rigor, estabelecer um padrão para o rótulo Maldito dentro da M.P.B. é complexo, pois podemos encaixar devaneios musicais, compositores surreais, ou aqueles que possuem um olhar quase acadêmico, como um pesquisador musical, além de abarcar a poesia caótica. Em essência, o rótulo reúne tudo o que foi produzido entre os anos 1960 e 1970, e que esteja longe da assimilação e compreensão imediata, tendo fortes interseções com gêneros como a Vanguarda Paulista, o Tropicalismo e o pós-Tropicalismo.

Alguns nomes como Egberto Gismonti, Moacir Santos ou Hermeto Pascoal apresentam estas características, mas se afinam mais ao jazz fusion, assim como Arthur Verocai também o fez, porém de modo mais obscuro, que o credencia a estar em nossa lista. Outros que nasceram como malditos, se tornaram referências da música nacional, como o caso de Raul Seixas, ainda com traços “malditos” em seu primeiro disco solo, “Krig-ha, bandolo!” (1973), como bem mostram “Cachorro-Urubu”, “Mosca na Sopa”, “Ouro de Tolo” faixas icônicas da MPB “maldita”, ou Belchior em seu clássico“Alucinação” (1976).

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Os 21 Discos essenciais pra conhecer os compositores malditos da MPB

Apresentamos hoje uma discografia básica desta cena que marcou a música brasileira pela contracultura.

1. Jorge Mautner: “Jorge Mautner” (1974)

Mautner é o grande poeta do Tropicalismo. Um dos mais geniais doidivanas da música brasileira, capas de misturar elementos mais heterogêneos do que água e óleo, ou maracatu com bomba atômica, como nos mostra no grande clássico de seu álbum de 1974, “Maracatu Atômico”, o mais próximo que seu anarquismo místico, extrapolando as barreiras do erudito e do popular, chegou do sucesso, principalmente depois que Chico Science & Nação Zumbi a ressuscitou como clássico do Rock Alternativo noventista.

A produção deste, que é seu segundo álbum de estúdio (após o marcante “Para iluminar a cidade” [1972]), ficou à cargo de Gilberto Gil, quem Mautner conheceu em Londres durante o exílio, sendo acompanhado de uma banda de respeito com Nelson Jacobina, Tuti Moreno, Chiquinho Azevedo, Rodolfo Grani Junior e Roberto de Carvalho. Além de “Maracatu Atômico”, este álbum traz “Guzzy Muzzy”, “Nababo ê” e “O Relógio Quebrou”  como destaques. Mautner experimentaria o sucesso como compositor através de nomes como Caetano Veloso, Gal Costa, Maria Bethânia e Gilberto Gil.

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2. Jards Macalé: “Jards Macalé” (1972)

Assim como Mautner, Jards Macalé é um compositor ligado ao triunvirato da música brasileira formado por Caetano Veloso, Gal Costa, e Maria Bethânia. Compositor de incrível talento técnico ao violão, também estudava com afinco composição, arranjo e orquestração, afinando-se ao grupo de tropicalistas sem participar efetivamente do movimento, sendo facilmente um dos nomes mais completos daquela época, se destacando com compositor de clássicos como “Vapor Barato”, “Gotham City”, “Pulsars e Quasars”, além de “Mal Secreto”, faixa que está presente neste primeiro e auto-intitulado álbum.

Com grande sofisticação técnica, sensibilidade musical e experimentalismo, Jards Macalé remodelou o tropicalismo à sua moda contracultural, se tornando o maior dos malditos, bem evidente na interpretação contundente de “Let’s Play That”, um poema de Torquato Neto. Já  “Revendo Amigos” teria incomodado a censura, enquanto “Farinho do Desprezo” seria cravada como uma de suas grandes composições. Destaque ainda ao casamento de Gil e Luiz Melodia em “Farrapo humano/A morte”, e a participação do mestre Lanny Gordin ao lado de Jards nos arranjos, violões e baixo.

3. Luiz Melodia: “Pérola Negra” (1973)

E por falar em Luiz Melodia, poucos o associam como um maldito da música brasileira, pelo sucesso que experimentou, principalmente com músicas em novelas, mas sua fórmula musical trazia todas as características experimentais e contraculturais do “movimento”, principalmente em seus primeiros trabalhos, com destaque a esse Pérola Negra”, seu primeiro álbum, e quicá sua obra máxima.

É impossível classificar a música aqui apresentada, indo do samba ao Rock, passando por certo experimentalismo jazzístico, libertinagem tropicalista, requinte do chorinho,  e até soul/boogie (como em “Farrapo Humano”). Além disso, composições como “Vale Quanto Pesa”, “Abundantemente Morte”, “Estácio, Holly Estácio” e a emblemática faixa-título conseguem soar tão diferenciadas quanto cativantes, assim como “Forró de janeiro” que traz a participação de  Damião Experiença, nosso próximo nome da lista.

4. Damião Experiença: “Planeta Lamma” (1974)

Baiano de nascimento, mas carioca de coração, Damião Experiença é o típico músico que não pertence a um nicho específico, e que tem pares espalhados em cada canto do país. Um espírito musical livre, que foi operador de radar da marinha e cafetão antes de iniciar sua carreira musical, lançando discos (mais de trinta) tão radicais quanto rebeldes  e místicos de forma totalmente independente.

Sua persona pitoresca investia em letras viajadas, alucinadas, escritas em uma língua própria, inspirada por seres extraterrenos oriundos do planeta Lamma. Daí vem o nome do disco gravado com um violão de apenas uma corda e um chocalho feito com tampas de garrafa pendurado, além de uma gaita.

Numa estrutura extremamente minimalista, Damião segue um caminho independente, um mundo particular, que pode agradar fãs de Frank Zappa, Sun Ra e Moondog. Indiscutivelmente existe algo de espiritual neste disco.

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5. Tom Zé: “Estudando o Samba” (1976)

Muito além daquele músico experimental, por vezes exagerado em suas investigações musicais, Tom Zé possui uma discografia ímpar dentro da Música Popular Brasileira, principalmente no que tange a originalidade. Ele já era o artista por trás de um belo disco auto-intitulado de 1972 e do emblemático “Todos os Olhos”de 1973, ousado já pela capa, mas é em “Estudando o Samba” que ele atinge sua máxima expressão dentro de sua abordagem musical angulosa, cheia de jogos de palavras e o ritmo cortante de versos curtos.

Antônio José Santana Martins, virou o Tom Zé, símbolo musical do Brasil, extrapolando nossas fronteira, à partir da premiação no festival da TV Record em 1968, com a música “São Paulo, Meu Amor”, sendo parte consistente do Tropicalismo, experimentando um considerável sucesso até o disco de 1973.

Fruto da desilusão com a incompreensão de seu trabalho por parte de público e crítica, “Estudando o Samba” é uma errática, vanguardista e genial homenagem às avessas ao samba, onde Tom Zé se livra de qualquer temor que ainda existia em sua persona como compositor e se torna o nome que iria admirar nomes importantes da música mundial, à começar por David Byrne, ex-líder do Talking Heads.

6. Itamar Assumpção e Banda Isca de Polícia: “Beleléu, leléu, eu” (1980)

Talvez, junto a Tom Zé, Itamar Assunção seja o nome mais famoso dentro do espectro anti-comercial dos compositores malditos. Sem amarras estílicas ou gêneros fronteiriços, pratica samba, funkjazz com a desenvoltura e picardia musical de um explorador. Ao lado da banda Isca de Polícia, Itamar levou a experimentação dentro da música brasileira a um patamar quase libertino, simultaneamente ao uso quase acadêmico de assonâncias concretistas.

Ator, compositor, arranjador e produtor cultural, Itamar concebeu um primeiro álbum que é referência do que convencionamos a chamar de vanguarda paulista, mesmo sendo nascido na Paraná, e músicas como “Aranha”, “Fon Fin Fan Fin Fun” e, principalmente, “Nego Dito”, se tornaram marcas de sua obra. Aos meus ouvidos, Assumpção é a versão brasileira de Frank Zappa.

7. Sérgio Sampaio: “Tem Que Acontecer” (1976)

Quando se pensa em compositores malditos da MPB logo nos vem à mente a figura do capixaba Sérgio Sampaio e sua icônica canção “Eu Quero é Botar Meu Bloco Na Rua”, com versos tão tresloucados que conseguiu burlar a censura, mas atingiu muita gente com sua poesia crua e suas melodias costuradas do cancioneiro popular. Sérgio já havia sido amaldiçoado ao lado de Raul Seixas, Edy Star e Miriam Batucada no, hoje clássico, “Sessão das Dez” (1971), da Sociedade da Grã-Ordem Kevernista (disco que aparecerá na nossa lista mais à frente).

Mas os meu ouvidos, “Tem que Acontecer” (1975) é o grande disco de Sérgio Sampaio, onde sua ousadia musical e sua poética franca está desfiada com mais esmero artístico e menos furor revolto, fato comprovado na faixa-título, uma das composições mais bonitas concebidas no Brasil dos anos 1970, também em “Cabras Pastando”“Até Outro Dia”, que mandam o mesmo recado de antes, mas agora mais maduro, e na insanidade maldita de “Que Loucura” (em homenagem ao poeta Torquato Neto). Mas também mostra esperança em “Quanto Mais” e desfia a mais fina poesia urbana em “Quatro Paredes”.

8. Lula Côrtes e Zé Ramalho: “Paêbirú” (1975)

Esse disco é uma lenda! Por muitos anos foi quase o Santo Graal da psicodelia brasileira, e sua edição original da época é o disco mais raro e valioso feito no Brasil em todos os tempos. Sua primeira edição foi destruída ao ser levada, em grande parte, pela correnteza que inundou a fábrica da gravadora Rozenblit. Lula Côrtes já vinha fazendo história na cena nordestina com o Satwa e o Flaviola e o Bando do Sol (ambas ao lado do Robertinho de Recife), até firmar com Zé Ramalho e lançar o grande álbum da psicodelia nordestina.

E a viagem experimental deste disco duplo, pensado quase como um coletivo hippie nordestino liderado por Lula Côrtes, passeia por cânticos sacros, elementos misticos e sonoridades africanas, em meio às texturas sonoras usuais dentro da psicodelia nordestina, misturando folk e rock com lisergia sertaneja com a beção dos quatro elementos da natureza. Para muitos, a música brasileira seria muito diferente se este álbum tivesse se disseminado, fazendo da cena nordestina a sucessora da Tropicalia. 

9. Walter Franco: “Ou Não” (1973)

Sim, “Revolver” (1975) é mais marcante e grande ponto da discografia de Walter Franco, um dos mais “famosos” compositores malditos da MPB. Mas aquele disco era mais psicodélico e menos tresloucado, já mostrando a evolução que seguiria nos próximos dois discos rumos a uma música mais “normal”.

Todavia, “Ou Não”, o disco de 1973 com a mosca na capa capa branca, é a cruza da forma inquieta de Walter Franco compor, flamejante pela poesia concreta impressa em seus versos, e a essência de sua alma musical “maldita”. De certa forma, cada composição aqui presente tem sua parcela de violência, de raiva e alta capacidade de incomodar por temas como loucura (“Cabeça”) e opressão (“Me Deixe Mudo”), quase como um Syd Barrett à brasileira, com experimentalismo folk em alta rotação. Nesse contexto, “Misturação”, “Pátio dos Louco”, e “Xaxados e Perdidos” são pérolas perdidas da MPB setentista!

10. Arrigo Barnabé e a Banda Sabor de Veneno: “Clara Crocodilo” (1980)

O suprassumo da Vanguarda Paulista, esse disco é um banho de atonalidades e dodecafonias por naipes de metais precisos, linhas de piano surreais, e vocais ora cantados, ora falados. A aparição quase hermética de Arrigo Barnabé e seu auto-infligido ostracismo dão ainda mais mística maldita a esse clássico, que revelou um gênio decepcionado com a cultura de massa, que queria desconstruir o formato da canção, e só pareado por Itamar Assumpção dentro de sua cena.

Barnabé é um compositor expressionista viajando entre o erudito, o krautrock, e o proto-experimentalismo eletrônico de Stockhausen com a música contemporânea brasileira, oferecendo um exótico e inovador prato musical dentro da MPB. “Clara Crocodilo” é poético, sarcástico, experimental, inovador e filho desencantado do tropicalismo, que atinge seu ápice em “Clara Crocodilo”, “Orgasmo Total”, “Diversões Eletrônicas” e “Infortúnio” (onde ele canta a emblemática frase: “Ele morreu porque pensou, pensou demais”).

11. Sociedade da Grã-Ordem Kavernista: “Sessão das Dez” (1971)

O quarteto formado por Raul Seixas, o mestre Sérgio Sampaio, Miriam Batucada e Edy Star foi o movimento mais anárquico da música nacional desde a Tropicália. Idealizado pelo ainda obscuro Raul Seixas, que à época se destacava nos bastidores do mercado fonográfico como produtor, a Sociedade da Grã-Ordem Kavernista era um esforço colaborativo de quatro nomes urbanos e peculiares.

E nessa explosão de criatividade tresloucada, o quarteto nos oferece doze composições entre psicodelia, ritmos regionais, soul, rock e até música brega, numa sátira contracultural vívida e colorida de sua época, com destaque a faixas como “Sessão das 10”, “Eu vou botar pra ferver”, e “Aos Trancos e Barrancos”.

Gravado em quinze dias, o álbum, com sua insanidade e estranheza, caiu no esquecimento, sendo incompreendido como muitos álbuns de sua época, até ser redescoberto nos anos 1990, quando Raul Seixas já tinha experimentado o ápice do sucesso e se tornar o maior nome do rock nacional. Se o Mothers of Invention fosse tropicalista, sairia algo como este disco.

12. Arthur Verocai: “Arthur Verocai” (1972)

Eis um maestro para a nossa lista de malditos! No início dos anos 1970, Arthur Verocai já tinha seu nome ligado a Ivan Lins, Jorge Ben, Gal Costa, MPB4 e Nelson Gonçalves como compositor e arranjador, o que o levou ao estúdio para registrar seu primeiro disco solo pela Continental, onde escolheu à dedo cada um dos músicos que iam ajudar a registrar suas composições. Após este disco ele se dedicou ao mercado publicitário, se tornando um obscuro compositor da música brasileira setentista, sendo redescoberto no início dos anos 2000.

Com bastante ousadia, ele se mostra arrojado na experimentação de ritmos, harmonias e melodias, dentro do contexto musical nacional e internacional de sua época, fundindo a excelência psicodélico-bucólico-regional do Clube da Esquina, com jazz e samba, dando mais grandiloquência aos arranjos (com sofisticadas orquestrações e clima de trilha sonora) do que às melodias vocais, atingindo o ápice em “Caboclo”“Sylvia”“Karina (Domingo no Grajaú)”.

13. Ednardo: “O Romance do Pavão Mysteriozo” (1974)

Ednardo, junto a Fagner e Belchior, completava o trio principal da renovação regionalista da música cearense, e marcou os anos 1970 com seu sucesso “Pavão mysteriozo”, de seu álbum “O romance do pavão mysteriozo” (1974), que figurou emblematicamente em trilha sonora de novela global. Sua proposta musical era uma psicodelia disfarçada de folk  nordestino, maracatu e baião, guiados por sua voz cativante entoando letras astrais, com profundidade espiritual e alegoria política.

Este primeiro álbum solo é uma herança direta do trabalho desenvolvido com  Rodger Rogério & Tetty no álbum “Pessoal do Ceará: Meu corpo, Minha embalagem, Todo gasto na viagem”, de forte apelo experimental em meio a exploração melódica envolvente e bem desenhada com cores agrestes, com conceito inspirado na obra-homônima de cordel, trazendo também camufladas críticas ao regime militar. Um álbum para perceber como a excelência musical cearense vai além de Fagner e Belchior.

14. Di Melo: “Di Melo” (1975)

Em 2016, chegava às lojas “Imorrível”, segundo disco da carreira de Di Mello após quatro décadas, artista pernambucano, radicado em São Paulo que se destacou com o auto-intitulado disco de 1975. Duas décadas antes de seu ressurgimento, o artista havia experimento a redescoberta de sua música pelo DJ’s  europeus e até viu seu disco aparecer rapidamente no clipe de “Don’t Stop the Party” do Black Eyed Peas.

E isso não é exagero, afinal, Di Melo conseguiu construir a genuína forma brasileira da soul music em seu primeiro álbum, laçado pela EMI-Odeon, infelizmente ignorado quando citam os grandes nomes do soul brasileiro. Estes sempre lembra de Wilson Simonal, Tim Maia, e Jorge Ben, mas a diversidade musical e a perspicácia dos versos fazem deste um dos grandes álbuns do gênero, infelizmente amaldiçoado na obscuridade da MPB.

Nomes como Hermeto Pascoal, Heraldo do Monte, José Briamonte e Geraldo Vespar estão ligados à obra que traz faixas como “Aceito Tudo”, “Sementes”, “Kilariô”, e a brilhante “A Vida Em Seus Métodos Diz Calma”.

15. Odair José: “Filho de José e Maria” (1977)

Odair José era um dos grandes nomes do mercado fonográfico brasileiro nos início dos anos 1970, explorando o romântico popular, que viria a ficar rotulado como “música brega”. Suas composições eram sucessos avassaladores nas rádios nacionais, mas, em 1976, inspirado pelos livros de Gibran Kalil Gibran e discos de rock gravados por Joe Walsh e Peter Frampton, começou a trabalhar num álbum conceitual duplo, com vinte e quatro músicas que contasse a trajetória de vida de um messias contemporâneo.

Mas o projeto não deu muito certo comercialmente falando. O que seria um disco duplo acabou truncado num álbum simples, com apenas dez músicas, e maldito por crítica e público. “O Filho de José e Maria”, foi lançado em 1977, e incomodou (já pela capa) por inserir na história drogas, rejeição social, solidão e especular sobre a condição sexual de seu protagonista facilmente associado com Jesus Cristo, que aos 33 anos ressuscitaria para a felicidade plena após assumir sua sexualidade.

Muito além disso, musicalmente, é a melhor performance de Odair em disco, com arranjos ousados e arrojados, voltados à forma do rock setentista, sendo uma opera-rock tipicamente brasileira. Um disco muito além de seu tempo! Ainda vale o registro para a participação de Hyldon (guitarra) e Robson Jorge (piano Fender Rhodes) na banda de apoio.

16. Ângela Rô Rô: “Ângela Rô Rô” (1979)

Demorou dois anos após a morte da cantora Maysa para que sua herdeira dentro da música nacional surgisse. É inegável que Ângela Maria Diniz Gonçalves  buscou as mesmas dores e os mesmos amores mal resolvidos do universo da fossa dos bares para dar voz a Ângela Rô Rô, uma persona da música brasileira que incomodava a sociedade brasileira, e os supostos valores da família.

Claro que Ângela inseriu as formas musicais de sua época à este universo, mais engajadas ao rock  e ao blues, que já atingiu sua forma mais saborosa neste primeiro álbum, lançado em 1979, trazendo belíssimas composições suas como “Amor Meu Grande Amor”, “A Mim e a Mais Ninguém”, “Tola foi VocꔓAgito e Uso”, entoadas com voz bem equilibrada entre força e sensibilidade.

Mas assim como Maysa, Ângela falava daquilo que vivia o que acarretou uma carreira com oscilações de qualidade, além de amaldiçoá-la dentro da hipocrisia brasileira a qual a música não sai incólume. Um álbum nunca igualado dentro de sua carreira.

17. Guilherme Lamounier: “Guilherme Lamounier” (1973)

Quiçá dono da música maldita mais afinada ao pop da lista, Lamounier compôs músicas que viraram hits nas vozes de Roupa Nova, Fábio Jr., Frenéticas e Sandy e Jr.. Teve “aulas” com o lendário produtor Carlos Imperial, que pretendia fazer com ele a mesma transformação pop promovida com Roberto Carlos, produzindo seu primeiro disco em 1970, mas que também provocou as vaias durante a apresentação de Lamounier do F.I.C. daquele ano.

Aquele primeiro disco passou batido, a não ser pela regravação de Tim Maia para a faixa “Cristina”, deixando sua carreira em aberto até encontrar com Tibério Gaspar, seu parceiro neste segundo disco de 1973.

Tibério trazia na bagagem experiência como compositor e muita influência do que absorveu em sua viagem fora do país, renovando a musicalidade soul/funk de Lamounier pelo folk e o rock, pincelado de psicodelia brasileira pós-tropicalista, ecoando de Arnaldo Baptista a Ronnie Von, rendendo canções concisas neste obscuro clássico da música setentista nacional. O álbum teve destaque com “Mini-Leila”, “Gb em Alto Relevo”, “Capitão de Papel” “Será que pus um grilo em sua Cabeça?”, mas caiu no esquecimento. Guilherme Lamounier ainda lançou mais um disco em 1978.

18. Sérgio Ricardo: “Arrebentação” (1970)

Diretor de cinema, ator, artista plástico, cantor e compositor, Sérgio Ricardo, nome artístico do paulista João Lutfi, é um dos mais completos artistas da lista. Influenciado pela contracultura absorvida nos EUA da década de 1960, quando esteve no histórico concerto de Bossa Nova no Carnegie Hall em Nova York, em 1962, se tornou uma vigorosa voz da resistência política dentro da cena nacional. Sua imagem quebrando o violão após ser vaiado pelo público ao cantar “Beto bom de bola”, num dos festivais musicais da Record, é icônica, e talvez, o pontapé inicial da vertente maldita da M.P.B.

“Arrebentação”  é um exemplo de maturidade e ousadia em uníssono para dar voz à criatividade de uma mente musical inquieta, que brinca com surrealismos, formas e conceitos musicais de modo único e com conhecimento de causa. Um disco provocativo, fruto de uma fase reclusa, encastelada e de clandestinidade em relação à mídia, trazendo a clássica “Analfavile”, que falava sobre a tortura no Brasil. Além desta, “Labirinto”, e o lamento de  “Mundo Velho Sem Porteira” são preciosidades escondidas da obra de Sérgio Ricardo, que teria seu nome vinculado às trilhas sonoras de obras como “A Noite do Espantalho”“Deus e o Diabo na Terra do Sol”.

19. Zé Geraldo: “Estradas” (1980)

“Cidadão” é um dos maiores clássicos do cancioneiro popular brasileiro, e teve sua primeira encarnação na voz de Zé Geraldo em seu emblemático primeiro álbum “Terceiro Mundo?” (1979), que também trazia a marcante “Promessas de um idiota às seis da manhã”. Zé Geraldo foi ainda jovem para São Paulo e um acidente de automóvel tirou-lhe a possibilidade de seguir carreira no futebol, e lhe entregou uma vida artística, que foi do romantismo à vanguarda em menos de uma década, até ser premiado nos festivais entre 1975 e 1978.

Indiscutivelmente, seu segundo álbum, “Estradas” (1980), é o ápice de sua forma personalíssima de rock rural, bem desenhada na pessoal “Negro Blues”, e nos arranjos da faixa-título. Existe um tom humano, humilde e simples em sua narrativa musical, que envolve pelos versos bem escritos e inspiradores, e pelo instrumental dramático e emocional, com pinceladas imprevisíveis, como em “O Profeta”, ou na simplicidade folk de “Como Dizia Bob Dylan”.

20. Taiguara: “Sucessos de Taiguara” (1980)

Uruguaio de nascimento (seu pai, maestro, excursionava pelo Uruguai quando ele nasceu), Taiguara é tão genial em sua composições quanto desafortunado em sua carreira, se tornando maldito mais pela perseguição política que sofrera.

Instrumentista de primeira linha, foi por suas letras provocativas, simbólicas e cheias de figuras de linguagem, que a censura da Ditadura Militar amplificou (como você pode conferir nesse texto), estendendo suas sombras pela carreira do compositor (ao todo, foram quase setenta músicas censuradas), um “maldito” famoso, que se exilou em Londres até voltar ao Brasil em 1975. Seu disco “Imyra, Tayra, Ipy” (1976) foi recolhido pela censura apenas após trinta e seis horas de seu lançamento, sem reedição até 2013.

Incansável, Taiguara lançava discos consistentes e emplacava sucessos atemporais como “Hoje”, “Universo do teu corpo” (uma das músicas mais lindas da M.P.B.), “Piano e viola”, “Amanda”, “Tributo a Jacob do Bandolim”, “Viagem”, “Berço de Marcela”, “Teu sonho não acabou”, “O Velho e o Novo” e “Que as Crianças Cantem Livres”, todos presentes nesta coletânea (abri este precedente por não conseguir me decidir entre dois discos para indicar) preciosa para se iniciar no mundo musical de Taiguara.

21. Hermes Aquino: “Desencontro de Primavera” (1977)

Sim! Esse é o disco que tem “Nuvem Passageira”, o sucesso acachapante de Hermes Aquino nos anos 1970, após figurar numa trilha sonora de novela da época (“O Casarão” [1976]). Em 1976, quando a canção explodiu, com direito a clipe produzido para o Fantástico, Hermes já completava uma década de carreira, figurando dentre os compositores tropicalistas, e se destacando pela parceria com Tom Zé em “Você Gosta?”, gravada pelo Liverpool, banda nacional de final dos anos 1960. Também emprestou composições para Os Brazões e O Bando.

“Nuvem Passageira” foi carro-chefe de seu primeiro disco solo, “Desencontro de Primavera” (1977), que só pode ser gravado e lançado pelo selo Tapecar por causa do sucesso atingido com o compacto daquela canção, que levou à reboque outros temas do disco, como “Longas Conversas”, “Desencontro de Primavera” (mais uma em trilha sonora de novela, agora, “Locomotivas”) e “Bola Louca e Colorida”. Na sequência mudaria para o selo Capitol, lançaria um segundo disco, mas sem o sucesso de antes por causa de divergências com a gravadora. Voltou para a terra natal no Rio Grande do Sul, trabalhando em rádio e compondo jingles. 


4 Melhores Discos de Compositores que Parecem, Mas não são Malditos

  1. Raul Seixas – “Krig-Há, Bandolo!”
  2. Belchior – “Alucinação”
  3. Tim Maia – Tim Maia
  4. Moacir Santos – “Coisas”

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5 comentários em “Música Brasileira: 21 discos para conhecer os “compositores malditos” da MPB”

  1. Fala Marcelo, tudo certo? Que matéria legal rapaz, parabéns. Eu gostaria de te chamar no particular, pois quero sua autorização pra usar ela em outro lance, se puder me responder, te agradeço imensamente.

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