“Abigail” é o grande disco da carreira de King Diamond. Pode até ser que você não o ache o melhor, mas é inegável que ele é o mais importante. Responsável por criar um modelo “King Diamond” de se fazer heavy metal, “Abigail” (1987) é o primeiro clássico da carreira solo do cantor.
Esse é um clássico disco conceitual (contando a história da bruxa Abigail com fortes referências ao ocultismo e a Anton Szandor LaVey), com trama obscura emoldurada por um heavy metal tradicional e bem elaborado por guitarras melódicas, que combinavam perfeitamente com os falsetes característicos de King Diamond.
King Diamond, é um admirador de LaVey, tendo mantido correspondência durante anos com muitos membro da Igreja de Satan, sendo um declarado seguidor do satanismo laveyneano e um dos únicos de sua geração que realmente seguia a filosofia sobre a qual cantava.
Kim Bendix Petrsen, ou simplesmente King Diamond é um dos nomes mais originais e influentes do heavy metal nos anos 1980. Com amplitude vocal impressionante, sua marca está tanto no falsete inimitável, quanto nos temas ocultistas que tem como filosofia de vida, ou na maquiagem que influenciou todo o metal extremo, principalmente o black metal noventista.
King Diamond iniciou sua carreira na banda Black Rose, em 1979, misturando hard rock com psicodelia, mas foi com o Mercyful Fate, banda dinamarquesa altamente influente, que solidificou seu nome de forma que seria capaz de seguir carreira solo após os conflitos de objetivos da banda que se seguiu ao seu segundo álbum.
“Melissa” (1983), primeiro full lenght da banda dinamarquesa Mercyful Fate, era agressivo, cortante, tétrico e assombroso dentro da estética tradicional da NWOBHM, com riffs instigantes e refrãos poderosos, enquanto “Don’t Break the Oath” (1984) é marcado pela mistura de NWOBHM com o thrash metal que surgia e que ajudou a influenciar, principalmente nos riffs e nas guitarras cortantes.
Todavia, “Don’t Break the Oath” (1984) dividiu os integrantes da banda, que então rachou e ruiu. Enquanto o guitarrista Hank Shermann queria seguir por um caminho mais comercial, King Diamond desejava manter a linha demoníaca. Foi o fim da primeira fase do Mercyful Fate, que só retornaria com “In The Shadows” (1993).
O caminho para “Abigail”: O Fim do Mercyful Fate
Após o lançamento de “Don’t Break The Oath” (1984) o Mercyful Fate rachou internamente, principalmente quando começou a trabalhar no próximo trabalho de estúdio. Muito disso se devia à turnê nos Estados Unidos que mudou a cabeça do guitarrista Hank Shermann que apresentou ideias e riffs para o novo trabalho muito mais leves.
Ao mesmo tempo, King Diamond já preparava músicas com a sonoridade de “Don’t Break The Oath” e jamais colocaria seu nome num material com aquele viés comercial. O vocalista se reuniu com o baixista Tim Grabber e o guitarrista Michael Denner para decidirem o próximo passo.
“Queríamos obter um contrato de gravação melhor e a única maneira de sermos bem sucedidos foi encerrar as atividades”, confessou o baixista Tim Grabber, que completou: “Concordamos que os fãs iriam imediatamente conectar o nome Mercyful Fate com o de King Diamond e foi por isso que resolvemos começar a banda solo de King”.
O último show do Mercyful Fate com a formação original foi realizado em 11 de abril de 1985. No dia seguinte, King Diamond se reuniu com os músicos da banda e comunicou sua decisão, obrigando-os a cancelar a turnê pela Alemanha.
O caminho para “Abigail”: O Nascimento da banda de King Diamond
Porém, as coisas no Mercyful Fate já eram incertas desde o ano anterior. Enquanto Hank Shermann fundava a nova banda de hard rock, o Fate, no final de 1984, King Diamond, Tim Grabber e Michael Denner colocavam seu plano em prática secretamente. Tanto que quando se cogitou a participação de Michael Denner no primeiro disco auto-intitulado do Fate, de 1985, ele confirmou que estava engajado no projeto de King Diamond.
A banda de King Diamond precisava de um baterista, já que Kim Ruzz era desafeto tanto do vocalista quanto do guitarrista. O baterista que viria para integrar o time de King Diamond era o jovem Mikkey Dee, um sueco de descendência grega, que aceitou prontamente logo que foi convidado.
O primeiro guitarrista cogitado para completar o time foi Pete Blakk que recusou a proposta. Logo, veio Floyd Constantin, que era da mesma banda de Blakk e Mikkey Dee, mas ele foi demitido logo no primeiro dia de gravação, por excessivo consumo de álcool.
A peça que faltava na banda de King Diamond era Andy LaRocque, um talentoso e respeitado guitarrista que teve uma química instantânea com os outros músicos. Mais tarde ele seria reconhecido como o fiel escudeiro de King Diamond, ajudando o vocalista a cunhar seus grandes discos da carreira solo.
O primeiro disco da carreira solo de King Diamond seria “Fatal Portrait”, lançado em 14 de março de 1986, que era basicamente um extensão do que era ouvido em “Don’t Break The Oath” (1984), do Mercyful Fate. Porém, ali King Diamond começaria a contar suas histórias de terror, afinal cinco faixas narravam a mesma história.
Após o lançamento do disco, a banda partiu para uma turnê pela Europa e pelos Estados Unidos, obtendo sucesso absoluto por onde passou, e onde King Diamond explorou ainda mais efeitos e cenários para tornar seu show cada vez mais teatral.
A Construção do Clássico “Abigail” de King Diamond.
O lançamento da carreira de King Diamond com “Fatal Portrait como cartão de visita foi um sucesso e para aproveitar o ritmo a banda já começou a trabalhar em seu segundo disco. O trabalho em estúdio começou em dezembro de 1986 e foi até fevereiro de 1987 no Soundtrack Studio, onde a banda trabalhou pela primeira vez com o produtor Roberto Falcao, que foi engenheiro de som do primeiro disco.
A mão do produtor pode ser sentida em pequenos detalhes. Por exemplo, para que Andy LaRocque mergulhasse no clima da história criada por King Diamond, o produtor o colocou numa cabine no fim da sala de gravação com apenas uma vela acesa. Isso porque King Diamond tinha elaborado um disco totalmente conceitual, narrando uma história de terror que veio numa madrugada de tempestade, num jorro de criatividade, com todos os eventos e personagens escritos e definidos em menos de duas horas.
Claro que foram ajustados alguns detalhes da história posteriormente e o complemento do enredo trazia algumas partes de narrativas que a mãe de King lhe contou, assim como a data e o nome Abigail foram retiradas de uma foto que um fã lhe mandou. A maior parte das músicas já estava composta quando King Diamond chegou com o conceito pronto.
“Abigail”: O Lançamento de um Clássico
“Abigail” foi lançado oficialmente no dia 15 de junho de 1987 e dedicado ao pai de King Diamond, que faleceu durante o processo de gravação do disco. O disco saiu pela gravadora Roadrunner e foi o primeiro daquele selo que conseguiu alcançar os charts da Billboard, alavancado pelas vendas de mais de 175 mil cópias já de saída.
O primeiro single foi para “The Family Ghost”, um dos grandes destaques do disco, que trazia no lado B uma faixa excluída do repertório original do álbum por não ter uma ligação com a história, intitulada “Shrine”.
“Abigail” (1987) era a primeira parte da grande trilogia de clássicos de King Diamond, continuada por “Them” (1988) e “Conspiracy” (1989), um disco conceitual, com trama obscura, emoldurada por um heavy metal tradicional e bem elaborado por guitarras melódicas, que combinavam perfeitamente com os falsetes característicos de King Diamond.
Faixas como “A Mansion in Darkness”, “The Family Ghost”, “Arrival”, “Abigail” e “Black Horsemen” praticamente lapidaram a identidade musical que vem à nossa mente quando pensamos em King Diamond, unindo peso, melodia, rapidez, e muita teatralidade, dinamizando a proposta de “Fatal Portrait” (1986), disco que inaugurou sua carreira pós-Mercyful Fate.
A Icônica Capa de “Abigail”
Um elemento que ajudou a construir a imagética de “Abigail” foi a capa do álbum, que trazia uma carruagem puxada por cavalos carregando um caixão em que supostamente estaria o corpo da pequena e diabólica Abigail.
Essa cena nunca é descrita nas músicas do disco, mas a arte se encaixou perfeitamente no conceito abordado pela estética emprestada nas clássicas histórias de terro do século XIX. Além disso, a capa foi feita especificamente para o álbum.
O próprio King Diamond falou sobre e concepção da imagem: “Foi encomendada especificamente para o álbum. Os [artistas] leram a história, leram a letra e daí veio a capa. A carruagem puxada por cavalos veio em um dos desenhos [e pensamos], ‘Uau, isso pode ser um motivo muito legal’, porque ‘Black Horsemen’ é uma das principais músicas dessa história. Houve poucas mudanças feitas antes de começarem a pintura, eles realmente podiam visualizar a história de uma maneira boa.”
Esse foi o disco que criou a lenda em torno de King Diamond e o apresentou a muitos de seus fãs, sendo a capa um elemento importante para o sucesso do álbum, como ele próprio admite: “Muitas pessoas nos ouviram pela primeira vez com esse álbum, e (risos) muitas pessoas nos disseram que ficaram com medo quando ouviram o álbum; isso lhes deu arrepios. E Acho que a capa teve muito a ver com isso também. Certamente tinha aquela sensação assustadora e clássica de terror. A melhor coisa disso é que você pode preparar o ouvinte através da capa para o que está por vir quando você começar a tocar a música.”
A Turnê de “Abigail”
Assim que a turnê foi anunciada o guitarrista Michael Denner saiu da banda, sendo substituído pelo guitarrista sueco Michael Moon, após alguns shows na Europa. Com Michael Moon, King Diamond cumpriu as datas nos Estados Unidos, mas o guitarrista foi demitido em seguida pela postura de rockstar que desagradava o vocalista e dono da banda. Mesmo assim, é ele o guitarrista que aparece no clipe de “The Family Ghost”.
O substituto seria Pete Blakk, que enfim aceitaria integrar a banda de King Diamond após algumas recusas, ao mesmo tempo que mantinha contato com os músicos da banda. Outra baixa viria em seguida, com a saída de Timi Hansen e o fim do núcleo oriundo do Mercyful Fate, que agora só tinha o vocalista King Diamond. Para o lugar do baixista veio Hal Patino.
O próximo passo foi mudar para os Estados Unidos com o intuito de aproveitar a efervescente cena para divulgar banda. Em seguida, mais um álbum clássico, intitulado “Them”, seria lançado em junho de 1988, mas sobre este álbum vamos deixar para comentar em outro artigo.
“Abigail II: The Revenge”.
Em 2002, King Diamond entregou uma segunda parte de “Abigail”, intitulada “Abigail II: The Revenge”. Este foi o primeiro álbum a trazer o guitarrista Mike Wead e o baterista Matt Thompson, além de trazer de volta o baixista Hal Patino.
“Songs for the Deaf”
Em 2017, o clássico “Abigail” completava três décadas de seu lançamento e desde 2015 King Diamond já colocava na estrada uma turnê em que tocava o disco na íntegra. “Songs For The Dead Live” foi registrado justamente nesse período, em duas apresentações diferentes. A primeira foi realizada no Graspop Metal Meeting, em 17 de junho de 2016, ao ar livre.
Da época deste clássico, somente o guitarrista e fiel escudeiro de King Diamond, Andy LaRocque, permanece na banda cuja performance como um todo é excepcional, principalmente em faixas como “A Mansion in Darkness”, “The Family Ghost”, “Arrival”, “Abigail” e “Black Horsemen”.
Todavia, mesmo que tanto banda quanto cantor estejam afiados e em plena forma, King Diamond está num nível artístico acima. Até por isso, “Songs For The Dead Live” pode ser visto como um complemento de luxo para o clássico “Abigail”. Sem dúvidas, “Abigail” (1987) é o disco mais importante da carreira de King Diamond!
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Matéria completa e bem organizada. Sem dúvidas um clássico dentro do metal. Influente até hoje. Parabéns pelo trabalho. Só temos a agradecer.