Uma banda inegavelmente inquieta quanto a sua música, o Moonspell tem a capacidade de entregar ótimos álbuns como “Irreligious” (1996), “Sin/Pecado” (1997), “Night Eternal” (2008) e “Extinct” (2015), intercalando-os a momentos discutíveis, como “Memorial” (2006) e “Alpha Noir” (2012).
Todavia, no meio de toda esta viagem discográfica senoidal, também é inegável que a emoção sempre foi ponto-chave, assim como a liberdade e distância dos preconceitos musicais.
Uma oscilação que pode ter atingido seu ponto máximo de excelência musical e emoção, tanto em forma quanto em conteúdo, neste mais recente trabalho, intitulado “1755”. Sem medo de errar, este é seu melhor álbum na última década.
As composições estão consistentes, mais diretas e agressivas, com leves traços da crueza do black metal e aspectos góticos acessíveis menos proeminentes, encaixando um conceito lírico de extrema sensibilidade, baseado no Terremoto de Lisboa.
Ocorrido em 1º de novembro de 1755, dia de Todos os Santos, o terremoto de 8,7 graus da escala Richter durou cerca de dez minutos, e foi seguido de um tsunami que varreu a capital portuguesa, matando 100 mil pessoas, quase metade da sua população.
Um evento marcante para Portugal, que chegou a abalar a fé de alguns portugueses, e que figurou no romance satírico “Candido”, de Voltaire, lançado em 1758. Para saber mais sobre o Terremoto de Lisboa, basta acessar esse nosso texto especial.
Neste aspecto, a língua portuguesa, utilizada na confecção dos versos, se encaixa perfeitamente no conceito do disco, influenciando a performance mais emocional e dramática do vocalista Fernando Ribeiro.
E o que poderia gerar estranheza se mostra de impacto incalculável já na primeira faixa, “Em Nome do Medo” (ligando “1755” ao álbum “Alpha Noir”, de 2012). Uma música com suspense quase cinematográfico, dramática, épica, sombria, criando um clima de temor reverente, com corais e instrumentação orquestrada !
Por esta composição já nasce a certeza de que realmente não caberiam letras em inglês neste disco, afinal, o tema pedia uma forma mais lamentosa, com mais possibilidades expressivas, que a língua portuguesa carrega.
Musicalmente, a sonoridade foi temperada pontualmente com sabores orientais (como evidente nas passagens de “1755”), e renovada por precisas inserções de elementos sinfônicos nada presunçosos.
Os riffs intensos e os refrãos cativantes são claramente os focos de cada composição, com vocais limpos, mas em perder a agressividade, e amparados num diálogo constante com corais imponentes.
Existe também uma dinâmica mais groovada e tribalmente ritmada, explosiva em certas arestas estruturais. A seção rítmica traz sempre algo de instável ao conceito sonoro, se encaixando à turbulência inerente ao conceito (bem perceptível em “Abanão”), enquanto os arranjos orquestrados e de vozes trazem os sentimentos urgentes da tragédia ao primeiro plano.
Isso tudo contornado por guitarras precisas de Ricardo Amorim, seja executando bases sólidas e pesadas, ou nos solos bem elaborados, com urgência, tenacidade (como em “Abanão”) e melodia (como na introdução de “In Tremor Dei”).
Em “1º de Novembro” Ricardo mostra-se um estudioso das formas clássicas do heavy metal, dando um sabor especial a esta composição que se destaca dentro do repertório, ao lado dos sinuosos orientalismos nas linhas de guitarra de “Ruínas”, que trazem mais nuances góticas à superfície dos arranjos.
Destaque também ao trabalho do tecladista Pedro Paixão, que consegue criar climas certos, tomando para si pontuais detalhes imprescindíveis, esfumaçando a marcha agressiva e imperiosa que guia o álbum com variadas tonalidades de tintas góticas.
O que pode parecer um tanto heterogêneo assim descrito, se encaixa de forma espontânea, encharcando o heavy metal de uma organicidade musical e uma realidade temática tenaz, fato irrefutável frente a composições como “In Tremor Dei” (com melodias lamentosas de Paulo Bragança, em contraste à agressividade de Fábio Ribeiro, e ecoando, mesmo que tenuemente, a tradição do fado), “Desastre” (um heavy metal crú e envolvente), “Evento” (com passagens multivariadas) e “Todos os Santos” (que faixa! Letra e música em união perfeita).
Existe também uma preocupação evidente com a construção das letras. É importante mencionar que o Terremoto de Lisboa foi visto como um castigo de Deus na sociedade fortemente influenciada pelos dogmas católicos, levando muitos refletirem sobre os desígnios de Deus, sua bondade e até mesmo sua existência.
E este fato está bem impresso em versos como “Que é feito do Deus que nos amava?” (“Evento”), “É já Deus quem nos mente culpado” (“Desastre”) e no desfecho com “Todos os Santos”, onde bradam que “Faz dia em Portugal ! Todos os Santos não Chegaram”.
“1755” é uma obra tão intrinsecamente pessoal que é fácil vê-la destacada dentro da discografia do Moonspell, onde toda música possui um valor expressivo, um significado emocional do conceito: tristeza, revolta, luto e esperança no final com a releitura doom/gothic para “Lanterna dos Afogados”, do Paralamas do Sucesso, que se encaixou como uma luva no tema e vai agradar os fãs de Type O Negative.
Uma performance bem trabalhada em estúdio pela produção de Tue Madsen, sobrepondo de modo orgânico texturas, orquestrações densas, belas e maléficas, além de camadas diferentes de peso, e gigantismo das harmonias vocais que invadem o cérebro.
O resultado final de “1755” é glorioso! Nada menos do que isso! Eu tinha dito que “1755” é o melhor álbum da banda na última década. Na verdade, me corrijo e afirmo que o Moonspell enfim cunhou sua obra-prima!
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