Você ouve cada faixa de “Spirit” e sabe que é o Depeche Mode desconstruindo a cartilha dos alemães do Kraftwerk, tirando o mofo do que soa datado, e remodelando a boa música eletrônica. Leia nossa resenha deste disco logo abaixo.
O Depeche Mode marcou uma geração da música eletrônica, principalmente no final dos anos 1980 com a trinca de álbuns “Black Celebration” (1986), “Music for the Masses” (1987) e “Violator” (1990), onde definiram sua identidade sombria, mezzo dançante, mezzo introspectiva, perfeita para embalar um baile moderno no castelo do Conde Drácula.
Todavia, à partir daí, começaram a explorar um pouco mais sua proposta, indo além da melodia mais envolvente, experimentando texturas e nuances diferentes para sua música. Sem mais depender dos holofotes do mainstream, e com um público cativo, desenharam uma sequência discográfica impecável, em cíclicos lançamentos a cada quatro anos, chegando a seu décimo quarto álbum de estúdio mostrando ainda mais maturidade e relevância para a música moderna.
“Going Backwards” abre o novo álbum do trio inglês apostando num ritmo orgânico, melancólico e melódico, que evolui para uma cinzenta peça eletro-pop manufaturada por quem entende do riscado. Uma faixa envolvente e impressionante na mesma medida. Já neste início vemos que o bom gosto será o guia deste novo capítulo, num artesanato que consegue imprimir muito sentimento e organicidade nas textura eletrônicas, a priori tomadas por artificiais, como bem demonstram a inquisitiva “Where’s The Revolution”, as introspectivas e densas “The Worst Crime” e “Eternal”, a vibrante “So Much Love” (numa pegada bem oitentista), e a belíssima “No More (This Is The Last Time)”.
Impressiona a forma como o Depeche Mode constrói suas composições com detalhes variados, e pinceladas diferenciadas ao longo dos arranjos, mas ainda consegue soar minimalista, acessível e brilhante.
Não espere uma autocópia de seus dias mais gloriosos de sucesso, a proposta do Depeche Mode é sempre ser diferente. A reinvenção! Talvez, por isso, conseguiram se manter interessantes ao longo de todos estes anos, e hoje nos presenteiam com maravilhas como “Scum”, que remodelam sua melancolia sombria, explorada com sentimento através da frieza eletrônica, assim como o fará por texturas diferentes na hipnótica “Fail”.
Confesso que senti a banda ainda mais enfurnada nos ensinamentos do Kraftwerk, mas sem perder sua identidade. Você ouve cada faixa de “Spirit” e sabe que é o Depeche Mode desconstruindo a cartilha dos alemães, tirando o mofo do que soa datado, e remodelando a boa música eletrônica. Duvida? Então, ouça “You Move” e “Poorman”.
Certamente, os destaques máximos do trabalho se encontram na sequência “Cover Me” e “Poison Heart”. Enquanto a primeira é mais climática, e até psicodélica, com ascendência de Jean-Michel Jarre em algumas passagens, Kraftwerk em outras, sobreposições de texturas, e até pontuais palhetadas à lá Pink Floyd de Martin Gore, o multi-instrumentista do trio, a segunda reconstrói uma balada pop sessentista por vias eletrônicas quase distópicas.
Por fim, não dá pra deixar de reverenciar a capacidade interpretativa de Dave Gahan. Suas linhas vocais são a alma deste disco, dando sabor orgânico a um requintado prato musical sintetizado. A edição de luxo deste álbum ainda traze faixas instrumentais e releituras das faixas “Poison Heart”, “Fail” e “So Much In Love”, onde exploram, numa vibe quase progressiva, a música eletrônica, que só engrandece ainda mais o trabalho original.
É música eletrônica inteligente, pra quem não quer só fritar o cérebro, mas também refletir sobre as possibilidades harmônicas da música moderna. O Depeche Mode não erra, e certamente já temos um lugar a menos na nossa lista de melhores de 2017!!!
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Pode ouvir o álbum sem medo! É um dos melhores do ano…
Escutei o single Where’s The Revolution na época do lançamento, mas ainda não tive contato com o álbum. A resenha me despertou interesse e esse sexto parágrafo é uma definição curta, mas perfeita sobre a banda!