Sempre achei que entre duas versões de uma mesma história, a verdade estaria numa terceira via!
Nunca a versão de uma das partes poderia encapsular a pura e cristalina verdade dos fatos.
Cada um dos dois lados, obviamente, teria seu relato influenciado e distorcido pela imparcialidade da sua percepção.
Logo, sempre existe uma terceira versão, que seria a irrefutável e imaculada forma como os fatos se desenrolaram.
Infelizmente, quase como uma exercício de física moderna, esta verdade pura, sem a ação e influência das paixões do observador, é inatingível!
Ou seja, para mim, nunca teremos ou saberemos a verdade pura sobre qualquer fato!
Lembra do ditado de que a história é contada é pelos vencedores? Ou, no caso mais extremo, pelos sobreviventes? É mais ou menos isso!
Um exemplo interessante dessa observação sobre a verdade pode ser encontrada numa cena musical da Noruega, no início dos anos 1990.
A história detalhada e contextualizada sobre uma das mais brutais gerações dentro do heavy metal, surgida naquele país escandinavo, pode ser encontrada neste texto.
Em suma, entre música pesada, adolescentes “satanistas” e uma sociedade estável, brotaram ações violentas, suicídio, ataques terroristas contra igrejas, e assassinatos.
Um destes assassinatos é uma das maiores polêmicas do primeiro cinquentenário do heavy metal, centrado no guitarrista da banda Mayhem, Euronymous, e no homem por trás do Burzum, Varg Vikernes.
Indo direto ao ponto, Varg matou Euronymous com dezenas de facadas, e as versões dos fatos e das motivações alteram-se dependendo de quem conta a história.
Como exemplo de minha visão tripartida da verdade, nesta história, dificilmente encontraremos até mesmo uma fresta da verdade, pois mesmo o black metal norueguês sendo um gênero radical e ensimesmado, a mentira e o direito de exagerar sempre foram artifícios usados para promover o quesito musical.
O que aconteceu ali na Noruega naqueles primeiros anos da década de 1990 gerou tanta curiosidade (e por que não, fascínio?) que dois jornalistas, o americano Michael Jenkins Moynihan e o norueguês Didrik Søderlind, dedicaram três anos de pesquisa (entre 1994 e 1997), coletando entrevistas com músicos das bandas de black metal, policiais, e jornalistas que acompanharam os eventos, além de documentos oficiais relacionados aos eventos.
O trabalho gerou o livro “Lords of Chaos: The Bloody Rise of the Satanic Metal Underground”.
Um dos títulos obrigatórios para quem quer entender tudo o que cercou o black metal norueguês em sua gênese, mas, obviamente, longe da verdade absoluta.
Assim como aqueles que detratam o livro, dentre estes os próprios envolvidos no tema abordado, não possuem a verdade absoluta, pois suas versões estão distorcidas pela força gravitacional de suas percepções e sentimentos.
Mas no que tange aos nomes de Varg Vikernes e Euronymous, tanto livro, quanto entrevistas, obras musicais, e outras versões dos fatos além da apresentada no livro, evidenciam Varg como um inveterado revisionista de sua própria história, com ideais voláteis oscilando dentro do extremismo político, enquanto Euronymous é percebido como um músico importante para a cena, um guia, mas de atos e discursos contraditórios.
Todavia, isso tudo esta longe da verdade, lembre disso, pois é afetado pela minha percepção!
Obviamente que o cinema não ia perder a oportunidade de também contar essa história!
O projeto já era antigo, mas só foi lançado em 2019, num filme que empresta o título principal do livro.
“Lords of Chaos”, o filme, de saída já confessa não te contar a verdade.
Em letras estilizadas avisa o espectador antes de tudo começar que é, sim, “baseado em verdades e mentiras”.
Só por aí você já pode guardar suas pedras entalhadas com os dizeres “historicamente errado”, “não foi assim que aconteceu”, ou “isso tudo é mentira”, pois em nenhum momento Jonas Åkerlund, diretor e um dos roteiristas do filme (ao lado de Dennis Magnusson) te vendeu “a verdade sobre os fatos”!
A menos que sua cognição não permita entender aquela mensagem inicial, não justifica atirar essas pedras!
E para tornar ainda mais inócuos os argumentos sobre a fidelidade com a verdade dos fatos (um conceito relativo como já vimos), “Lords of Chaos” me pareceu um filme biográfico sobre Euronymous, e não uma reconstituição da cena norueguesa de black metal.
É justamente ele quem narra a história, e ao contrário do livro, a narrativa não tem nada de documental, concentrando-se na persona de Euronymous e tudo que o orbitava.
Aí, precisamos refletir sobre outro conceito: o filme biográfico! E para isso vamos usar o “Guia Ilustrado Zahar de Cinema”, que sobre esse conceito, diz:
“Um filme biográfico frequenta todos os gêneros do cinema, mas possui algumas características que fazem dele um gênero próprio.
“No geral, é um retrato dramatizado e enfeitado de alguém conhecido, riscado sobre certos princípios narrativos: o protagonista arrisca tudo por seus objetivos e, antes de alcançar o clímax de sua história, enfrenta solidão, conflitos pessoais e diversas aflições.”
“Lords of Chaos” é um filme biográfico!
Não sobre o black metal, mas sobre Euronymous.
Tanto que não existem menções diretas (salvo em camisetas, posteres, e trechos rápidos de músicas) a outras bandas da cena que não sejam o Mayhem e o Burzum.
Claro, existem alguns clássicos do heavy metal na trilha sonora, e até um trecho de uma música do Sarcófago rolando no porão da Helvete, loja de Euronymous que era o centro do Inner Circle, ou Black Circle.
Voltando à definição do filme biográfico, portanto, não faz sentido você reclamar da dramatização e da romanceação da biografia de Euronymous. Afinal, estas são características de uma cine-biografia.
Seria o mesmo que você reclamar de tiros, socos, ou perseguições num filme de ação!
Creio que essa parte sobre ser absurdo pedir acuracidade dos fatos para “Lords of Chaos” já esteja bem estabelecida. Ainda mais quando nem os reais envolvidos (sobreviventes) concordam em suas versões.
Isso posto, vamos direcionar nossa análise para outras especificidades.
De fato, Jonas Åkerlund abusou do direito de exagerar em seu roteiro, se valendo de cada lenda, e do que de mais impactante existia nas diferentes versões dos fatos.
Mas não há dúvidas de que sua mão como diretor é muito pesada em cada movimento do filme, principalmente nas cenas guiadas pela música.
Åkerlund é um premiado diretor de videoclipes, além de baterista (ele teria gravado a demo “Scandinavian Metal Attack”, do Bathory), o que dá a ele o know how exato para o ótimo resultado final de “Lords of Chaos”.
Preste atenção ao trabalho que ele faz na apresentação do Mayhem em que o vocalista Dead se mutila no palco. É sinistro, visceral e arrepiante!
Outro destaque é a cena da festa regada a bebida, sexo e muito heavy metal.
Porém, nada supera a forma com que foram rodados os suicídios de Dead, o assassinato do homossexual Magne Andreassen por Bård “Faust” Eithun, e o assassinato de Euronymous por Varg.
Todos sem truques fáceis de corte ou movimentos de câmera, e com violência explícita em sequências cruas . É quase como se ele te dissesse: “vc não queria ver? Então agora senta aí e assiste sem amenidades!”
Aliás, a sequência do assassinato de Euronymous é tão brutal, fria e embebida em maldade gratuita quanto a música que propagavam.
Os cortes de câmera de “Lords of Chaos” são secos, e a crueza das imagens casa muito bem a história a ser contada. O que gera tensão, amplificada pelas ótimas inserções da trilha sonora composta pelo Sigur Ros.
A reconstrução dos locais, ambientes e figurinos também está indefectível e os únicos artifícios sujos do filme estão no roteiro, que promove uma dualidade afim de gerar antipatia por Varg e empatia por Euronymous.
Aliás, “Lords of Chaos” nos apresenta um Euronymous contraditório em ação e discurso, oportunista em sua liderança, mas ainda uma vítima que tentava pôr seus conflitos em ordem e seguir seu caminho sem problemas; enquanto Varg é o algoz, com pensamento provinciano radical, mente de psicopata, manipulador, mas com talento para a música que se propunham a criar.
A forma como a história foi contada deixa a impressão que Euronymous era um aventureiro em busca de um tesouro, mas solto no inferno e cercado por loucos. E nós sabemos que não há dualidade no inferno.
Ele até ganhou um romance com uma garota que muitos alegam não ter existido (Varg diz que ele tinha se assumido homossexual pouco antes de morrer), assim como um corte de cabelo.
Esta namorada fictícia tem uma passagem importante no filme para mostrar a mente pervertida de Varg.
E sobre ter inventado personagens, nos créditos do próprio filme temos a tradicional nota: “Mesmo que esse filme seja baseado numa história real, alguns personagens foram modificados ou inventados, e alguns dos incidentes são ficcionais. Qualquer semelhança entre tais elementos de personagens e eventos, como qualquer indivíduo ou evento da vida real, é total coincidência”.
Quando se lê sobre as lendas, os documentos, ou ouve-se a músicas das bandas que elevaram a Noruega ao patamar de meca do black metal, muitas vezes nos esquecemos que estamos diante de jovens ou adolescentes, oscilando entre os 16 e 24 anos.
Até por estampar esse fato sem amenidades, o filme já gera um impacto muito maior.
Eram, no geral, jovens músicos rebeldes e enfadados de um país pacato, mas alguns dos líderes deste movimento se mostravam com distúrbios psicológicos e emocionais sérios!
E aqui cabe menção às ótimas atuações de Rory Culkin (que pode até estar um tanto deslocado do contexto black metal, mas foi ideal para dar a empatia que o filme queria ao Euronymous registrado por Akerlund), Emory Cohen (algumas vezes exagerado, mas ainda assim eficiente em criar um Varg que gera antipatia), e principalmente de Jack Kilmer (como o perturbado e depressivo Dead, que rouba a cena na primeira metade do filme).
Uma curiosidade quanto ao elenco é que Varg, um antissemita, teria ficado furioso porque o ator que o interpreta é um judeu descendente de refugiados da Rússia.
Portanto, “Lords of Chaos” é nada além de um ótimo filme, com potencial para virar cult em algum tempo.
Entretenimento bem feito, não um documentário, ou reconstituição dos fatos, e assim deve ser encarado!
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Olá Neuza,
obrigado pelo comentário, primeiramente!
Também curti o filme e pretendo assisti-lo de novo algumas vezes.
Vi críticas quanto ao Varg tomar leite com achocolatado na hr do assassinato, mas para mim isso foi só uma forma de mostra a sua capacidade de matar alguém a sangue frio, com crueldade e sem nenhum remorso!
Abraços e sinta-se convidada a explorar o nosso site.
Eu já conhecia toda a história do Mayhem, dos seus integrantes e sobre o movimento black metal. Assistir ao filme totalmente empolgada e bastante curiosa.
Simpatizei totalmente com o Euronymous, e esta era intenção do filme parabéns, tiveram sucesso.
Fiquei levemente chateada por não abordaram tanto o Dead, mas logo compreendi que o filme era sobre Euronymous e não sobre o Mayhem.
A história é trágica, mas aquelas poucas cenas de comédia, como a parte da entrevista do Varg e é oferecido chá aos jornalistas e também a parte em que o baterista resolver sair da banda e ele simplesmente diz:”Até logo”. Ajudaram a amenizar, inicialmente, as partes de “horrores” que aconteceriam mais a frente no filme.
Gostei bastante em que eles se apegaram aos pequenos detalhes reais, como as roupas dos atores serem idênticas aos dos originais.
Porém, a parte em que o Dead se suicida, achei um pouco estranho que no primeiro corte no braço ele não ter dado um grito se quer, já que no filme ele não passa a lâmina da faca no braço, ele encrava a faca no braço e age “normalmente”.
Eu vi algumas críticas sobre o comportamento dos rapazes no filme, mas ao meu ver, eram todos adolescentes, jovens recebendo fama e admiração, eles seriam mesmo bagunceiros e loucos, são jovens afinal.
Por fim, eu gostei muito do filme e o verei novamente por várias e várias vezes.