O que o death metal britânico tem de tão especial? Variedade, pioneirismo e influência, pra ficar em apenas três adjetivos. Pense por um instante na diversidade musical de bandas como Paradise Lost, Anathema, My Dying Bride (o trio de ferro do death/doom metal inglês), Carcass (pioneiro do splatter/goregrind e do death metal melódico), Bolt Thrower, Napalm Death (criadora do grindcore), Benediction, Extreme Noise Terror, Dark Heresy, Impaler, Necrosanct, Desecrator, e o Cancer, pra ficar apenas nas mais clássicas.
Todas estas bandas que ajudaram a conjurar o death metal britânico surgiram combinando a raiva do death metal com o estilo agressivo do crust/punk, e dando um toque mais refinado às harmonias de guitarras herdadas do heavy metal clássico britânico do início dos anos 1980.
Além disso, a maioria dos músicos destas bandas iam além de ouvir thrash metal e death metal; eles apreciavam a criatividade e os estilos diferentes que apareciam na década de 1980 e eram assimilados através das históricas sessões de John Peel na BBC.
Karl Willetts, vocalista do Bolt Thrower, chegou a afirmar que uma das razões da cena britânica do death metal ser tão diferenciada era a mistura dos pilares do metal extremo com o punk/crust e o experimentalismo gótico das respectivas cenas de seu país.
“A gente com o Bolt Thrower, os caras do Napalm Death, Benediction e Carcass, todos tínhamos ligações musicais semelhantes, todos éramos conectados por fortes laços de amizade, mas cada um de nós recebia uma herança musical diferente”, disse Willets, que arremata dizendo que “a música extrema britânica ganhou muitas faces nesta época, mas o senso de identidade sempre veio do punk”.
Mesmo assim, quando estas bandas começaram a surgir, a diversidade da abordagem de todas elas tornavam difícil para a imprensa especializada rotular a cena. Algo compreensível se você pensar que várias delas seriam pioneiras em novos afluentes do heavy metal como o grindcore, o splatter/goregrind, o gothic metal, o doom/death metal, o melodic death metal e o death n’ roll, por exemplo.
No fim das contas, como o death metal ainda estava se formando e não tinha uma cara bem definida, o estilo foi usado na Inglaterra para encaixotar junto bandas como o Napalm Death, o Carcass, o Bolt Thrower e o Paradise Lost, nomes com personalidades musicais distintas, mas que praticavam uma música extrema.
Com isso em mente, hoje vamos escolher cinco discos clássicos e essenciais para conhecer a diversificada, brutal e criativa forma britânica do death metal.
1) Paradise Lost – “Lost Paradise” (1990)
“Lost Paradise” é o primeiro full lenght do Paradise Lost após sua fundação em 1988, na cidade de Halifax, na Inglaterra, quando emprestaram o título do poema épico de John Milton, e este disco representa o death/doom metal tipicamente inglês do trio de ferro completado por Anathema e My Dying Bride.
Este é basicamente um disco de death metal, com esboços do que seria inovador e marcante em discos como “Gothic” (1991) e “Icon” (1993) que viriam na sequência, principalmente na faixa “Breeding Fear”, que já traz alguns vocais femininos contrastando com os guturais.
Os ritmos são lentos, as timbragens sujas e a produção old school amplifica o peso orgânico e mórbido que evoca referências óbvias e clássicas. O que hoje pode soar ensimesmado e enrijecido, para a época uma banda que tocava death metal apenas em ritmo lento era algo novo. “Nós não acreditávamos que você precisa ser rápido para ser extremo”, refletiria anos mais tarde o guitarrista Gregor Mackintosh.
“Lost Paradise” é um disco emblemático, que junto a “Serenades”, do Anathema, e“As the Flower Withers”, do My Dying Bride, representam o histórico death/doom metal do selo Peaceville.
2) Napalm Death – “Harmony Corruption” (1990)
Para muitos esse é o melhor disco do Napalm Death! Particularmente eu prefiro “From Enslavement to Obliteration”, simplesmente por ser o disco que me abriu as portas para a música extrema, porém não há como negar que “Harmony Corruption” completava a metamorfose do Napalm Death, formatando, enfim, sua personalidade musical.
Agora com o padrão de qualidade da produção de Scott Burns, o Napalm Death apresentava seu disco mais bem acabado, sem macular seu DNA transgressivo e ultrajante, mas dando mais espaço para o thrash metal e o death metal norte-americano (as participações de Glenn Benton e Donald Tardy confirmam isso) em seu violentíssimo grindcore.
Após “From Enslavement to Obliteration” o quarteto se reduziu ao duo Shane Embury e o baterista Mick Harris. Para completar o time vieram o vocalista Mark “Barney” Greenway, egresso do Benediction (onde gravou o clássico “Subconscious Terror”), e a dupla de guitarristas Jesse Pintado (oriundo do Terrorizer) e Mitch Harris (que já havia tocado com Mick no Defecation). Ou seja, era quase um supergrupo do death metal/grindcore daqueles tempos.
Não há como negar que os vocais de Barney se encaixaram à proposta do Napalm Death de forma ainda melhor que Lee Dorrian, pois seu timbre “harmonizou” (se é que isso se aplica ao entrópico Napalm Death) perfeitamente ao instrumental mais “elaborado” e de maiores possibilidades por incluir dois ótimos guitarristas. Ignore a péssima capa e mergulhe na fórmula de brutal death metal que seria repetida à exaustão nos anos 1990.
3) Carcass – “Necroticism: Descanting The Insalubrious” (1991)
O Carcass assombrou o death metal cruzando a pancadaria grindcore do Napalm Death com toda a nojeira e escatologia possível, inaugurando o goregrind ou splatter metal no clássico primeiro disco, “Reek Of Putrefaction” (o nome já diz tudo), um disco que trazia belos “poemas de amor” em suas letras e cuja a capa ficou clássica em toda historia do death metal.
Porém, o Carcass era uma banda em constante transformação e após a chegada de Michael Amott, um guitarrista técnico e virtuoso, a musicalidade da banda começou a apresentar mais classe e originalidade, culminando na obra-prima “Necroticism – Descanting The Insalubrious” (1991).
Este disco marcava o distanciamento irremediável do Carcass com o grindcore. Agora, a banda apresentava um material que fugia a quaisquer rótulos, personalíssimo, técnico, brutal, agressivo e melódico, com nítidas influências da música pesada da década de 1970. A maturidade havia chegado, a capa era “normal” e as letras se distanciavam cada vez mais da terminologia médica dos dois discos que o precederam.
A consagração definitiva do Carcass viria com “Heartwork” (1993), mas foi com “Necroticism – Descanting The Insalubrious” (1991) que o Carcass mudou de patamar, sendo praticamente inacreditável que aquele mesmo grupo que fizera um LP tão tosco e quase simplório quanto “Reek Of Putrefaction” podia ter se transformado no mais fabuloso nome do metal inglês de sua época.
4) Bolt Thrower – “Realm of Chaos: Slaves to Darkness” (1989)
O Bolt Thrower foi uma das poucas bandas a passar com sua identidade incólume e incorruptível pelos anos 1990. Que o digam discos como “…For Victory” (1994) e “Mercenary” (1998). Esses podem até não ser os melhores discos da banda, mas representavam bem a lealdade dos ingleses à sua forma crua e pesada de death metal.
Entre os melhores discos do Bolt Thrower facilmente esta “Realm of Chaos: Slaves to Darkness” (1989), que chamava a atenção pelo conceito girando em torno de um jogo de RPG e, especialmente, pela capa, muito distante dos motivos mórbidos, apocalípticos e satânicos tão comuns ao death metal em 1989.
Este disco conceitualmente inspirado num suplemento homônimo do popular jogo de estratégia Warhammer Fantasy Battles, mostrava uma banda defendendo uma forma crua e pesada de música, que havia chegado ao último estágio da metamorfose de sua personalidade musical baseada numa mistura de Possessed e Slayer com Discharge e Amebix.
Nesse sentido “Realm of Chaos: Slaves to Darkness” (1989) era uma demonstração do típico death metal britânico, seja ele visceral, rápido e com riffs pesadíssimos, ou cadenciado, com solos trabalhados e fortes esbarrões no doom metal, além de estrutura e determinação crust/punk.
5) Benediction – “Transcend the Rubicon” (1993)
Benediction é um nome tradicional do death metal europeu, não só do Reino Unido. Responsável por cometer clássicos do estilo como “Subconscious Terror”, “The Grand Leveller” e “Transcend the Rubicon” a banda sempre teve um sonoridade marcante, construída em estúdio com crueza nas timbragens, embebida de atitude punk e recheada de riffs contundentes e grooves violentos.
Apesar de ser lembrada apenas como a banda de onde veio Mark “Barney” Greenway, vocalista do Napalm Death, o seu substituto, Dave Ingram, criou uma marca própria para os vocais guturais desenvolvida na maioria dos clássicos do Benediction, incluindo este “Transcend the Rubicon”, um dos discos mais importantes da primeira década do death metal.
Neste disco fica claro que a alma do Benediction sempre esteve encarnada na dupla de guitarristas, Darren Brookes e Peter Rew, que desenha uma oscilação entre riffs maléficos cadenciados e bases rápidas, brutais, que levava a tensão ao ápice, mas de uma forma brutalmente classuda, se é que isso e possível.
Com isso, “Transcend the Rubicon” alçava o desfile de faixas rápidas e diretas ao lado de outras lentas e pesadas, porém sempre agressivas e brutais, de “Subconscious Terror”, “The Grand Leveller” para um novo patamar, e com isso abria possibilidades e horizontes mais maduros para o death metal, como se atualizassem o estilo sem macular seus cânones.
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