Dono de uma voz que marcou uma geração, sendo, inclusive, comparado a Robert Plant, Chris Cornell chegou a meados desta década com mais um novo trabalho, um tanto diferente do que se esperava dele.
Inspirado pela turnê Songbook, inciada em 2011, onde Cornell executou canções das diversas fases de sua carreira, bem como covers, somente acompanhado de seu violão, ele investiu em um álbum acústico, que bebe nas melhores fontes da música folk sessentista e setentista.
Aos ouvidos acostumados com as guitarras densas do Soundgarden, ou dos riffs furiosos do Audioslave, acompanhando a voz de Cornell, pode soar um tanto estranho ouvir estas composições.
Todavia, aos iniciados na versátil carreira solo de Chris (com altos e baixos, sendo que os baixos são muito baixos), estas composições cheias de sensibilidade e honestidade musical seguirão o padrão de qualidade de álbuns magistrais como Euphoria Morning (1999) e Carry On (2007), oferecendo-nos uma visita a um oásis dentro do deserto de mais do mesmo da música alternativa atual.
Quem já teve contato com o álbum acústico Unplugged In Sweden (2006), sabe como a voz de Cornell de enquadra magistralmente no formato voz e violão, com interpretações inspiradas e carregadas de sentimento.
Em Higher Truth, o trovador Chris Cornell se faz presente com o uso magistral de sua amplitude e interpretação vocal, como forma de imprimir emoção às canções dentro das harmonias acústicas.
A abertura com Nearly Forgot My Broken Heart (onde Cornell também toca bandolim) manipula texturas acústicas, ecoando certa modernização dentro do folk rock, principalmente com as guitarras psicodélicas se apresentando nos solos.
Na outra ponta da corda, temos Murderer of Blue Skies, que vem cheia de instrumentação e mais próxima do habitual à carreira de Chris Cornell.
Podemos dizer que o álbum como um todo transita entre estas duas abordagens, não deixando a sonoridade datada, principalmente pela inserção de elementos modernos nos arranjos.
Obviamente, muitas influências podem ser detectadas ao longo da audição do álbum. Dentre as mais curiosas, temos a sombra de Nick Drake nas faixas Dead Wishes e Through the Window (esta ainda com pinceladas que lembram a primeira fase de Leonard Cohen).
Ambas são ótimas canções folk, com linhas de violão que remetem a Nick, um nome da música que Chris admitiu ter demorado algum tempo para admirar.
Nas palavras dele “um dos irmãos Robinson (do Black Crowes) me apresentou Nick Drake”, todavia, ele teria odiado tudo até que ouviu o álbum Pink Moon (1972), afirmando que “o jeito dele tocar violão e as músicas são fenomenais”.
Além de Nick Drake, a fase Nebraska (1982) de Bruce Springsteen é lembrada em faixas como Wrong Side (faixa bônus) e Worried Moon, com clima bucólico em conluio a harmonias simples e melódicas, unidas por linhas precisas de harmônica, que também aparecem em Behind The Road (faixa bônus), composição mais próxima da apresentada nos primórdios de sua carreira solo e de leve tempero gospel.
As típicas melodias de Chris Cornell estão em Before We Disappear (com sonoridade introspectiva amplificada e bastante sentimento), Josephine (balada simples ao violão e com belíssimos arranjos de cordas), Higher Truth (notas ao piano, ritmo cadenciado, com instrumentação forte e harmonias familiares) e Our Time in the Universe (moderna e mais próxima do usual do artista).
Dada a sequência dos álbuns solo de Chris Cornell, esta é uma abordagem inesperada, mas que se mostrou inspirada e eficaz, oxigenando sua carreira e ambientando-o num terreno que há pouco tempo ignorava, como confessa ao dizer que “rejeitei a maior da música folk a que fui exposto nos anos 1970“.
Sua mudança de posição se deu quando começou a ouvir Tom Waits e algumas coisas de Jim Croce e Cat Stevens.
Bom pra nós que podemos nos deleitar com um ótimo álbum de música folk, de um intérprete à frente de seus pares contemporâneos, e que precoce e infelizmente nos deixou órfãos de seu talento em 2017.
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