Whitesnake – Resenha de “Flesh & Blood” (2019)

 

Whitesnake Flesh & Blood
Whitesnake: “Flesh & Blood” (2019 | Hellion Records, Frontiers Music srl) NOTA:9,5

Enfim podemos ter em mãos um novo trabalho do Whitesnake com músicas novas.

O último disco com material inédito havia sido “Forevermore” (2011), que foi seguido de “The Purple Album” (2015), na discografia de estúdio, um disco trazendo releituras de algumas composições do Deep Purple.

Décimo terceiro álbum de estúdio do Whitesnake, “Flesh & Blood” abre com a promessa de algo interessante pela frente com a instigante “Good to See You Again”.

Dona de uma tenacidade hard rock essa faixa de abertura traz guitarras provocantes e os vocais insinuantes de David Coverdale, o eterno capitão da banda, principalmente no refrão grudento e com picardia na medida certa.

Outra coisa que essa faixa inicial nos mostra é a importância da dupla de guitarristas, Reb Beach e Joel Hoekstra, ao som atual do Whitesnake. Ambos têm grande parcela na excelência do que ouviremos ao longo de “Flesh & Blood”.

Reb Beach potencializa a sinuosidade do slide e a rusticidade do legado do blues para o jogo, enquanto Hoekstra é o artífice dos solos instigantes e dos riffs com ganchos melódicos encharcados de adrenalina.

O trabalho de ambos, entrelaçados, dão uma impressão de que a fusão do heavy rock com o blues rock foi retomada como feita no passado, lembrando e mesclando elementos, em momentos diversos, de discos como “Lovehunter” (1979 – pelas remissões ao blues rock britânico), “Slide It In” (1984 – pela organicidade) e “Whitesnake” (1987 – pelo alto poder melódico).

Claro que a seção rítmica, com a solidez do baixo de Michael Devin e a simplicidade e experiência do lendário Tommy Aldridge, sustentam as harmonias com competência, sabendo que o brilho de “Flesh & Blood” vem das guitarras.

Pra falar a verdade, até Coverdale parece concordar com isso, e uma rápida conferida na excelente “Get Up” (que pisa no acelerador em guitarras vertiginosas em constante duelo e um trabalho inteligente das linhas de Coverdale, que se abstém de entrar na guerra musical de seus escudeiros), dá ainda mais força a essa impressão.

Desta forma, não seria errado dizer que “Flesh & Blood” é um disco que soa como uma volta ao passado, buscando elementos de todas as suas fases, porém sem o apelo saudosista dos atuais e diversos emuladores de sua sonoridade.

E quem acompanha o cenário atual, sabe que existem inúmeras “cópias” do Whitesnake, o que nem nos permite dizer que a fórmula da banda está datada dentro do hard rock atual.

Talvez as letras sofram desse mal e pudessem ser trabalhadas a fim de dialogar melhor com a modernidade, isso é fato.

Isso posto, algumas faixas corroboram nossa observação da inspiração no próprio passado.

“When I Think of You (Color Me Blue)”, por exemplo, é aquela balada típica da banda, como uma irmã mais nova do sucesso “Here I Go Again”, e será impossível não  lembrar da clássica “Judgment Day”, ao ouvir a dramática e cadenciada “Heart of Stone”, onde Coverdale consegue emocionar como nos velhos tempos.

“Trouble Is Your Middle Name” (uma das primeiras faixas a serem compostas para o novo trabalho) irá agradar quem gosta do tempero bluesy setentista que a banda aplicava fartamente em sua fase setentista.

É muito bom ouvir um álbum tão energético como esse após os rumores da aposentadoria do Whitesnake, ou melhor, de David Coverdale, depois do lançamento de “Purple Album” (2015).

Aliás, para aqueles como eu, que acreditavam que o disco de “auto-covers” de David Coverdale era a prova da sua falta de criatividade e vontade, “Flesh & Blood” é um tapa nas fuças, mesmo que eu ainda ache que seja um golpe dado mais pela dupla Beach-Hoekstra do que pelo senhor Coverdale.

As digitais da dupla como compositores estão marcadas em nove composições, o que obviamente deu novo fôlego à identidade consolidada do Whitesnake.

Continuando nossa peregrinação pelo repertório, chegamos a uma das melhores peças das treze apresentadas: “Hey You”. Pesada, apesar do refrão melódico, ela traz as melhores linhas vocais de Coverdale de todo o disco, contribuindo para a dinâmica do disco, principalmente por olhar para o passado dourado, não só da banda, mas do Classic/Melodic Rock, sem tirar os pés do presente.

Coverdale, apesar da clara ação do tempo em sua voz (o cara já está com quase setenta anos de idade), também mostra que ainda tem muita lenha pra queimar na faixa-título, com seu refrão poderoso e uma arrepiante passagem no solo de guitarra.

Por falar em dinâmica, se “Gonna Be Alright” traz uma cadência climática por melodias dramáticas e um refrão típico, sua sequência, com “Shut Up & Kiss Me”, primeiro single, explode o sabor oitentista do rock n’ roll com força hard rock, mantendo a energia e a adrenalina tão alta quanto a qualidade do trabalho.

Mesma dinâmica usada entre a já citada “Get Up”  e “Well I Never” (de groove cadenciado e com o refrão mais grudento do disco! Acredite, você ficará com ele na cabeça por dias seguidos).

O único ponto fraco do repertório é “Always & Forever”, com uma simplicidade melódica que destoa um pouco das demais composições, baseada numa fórmula mezzo power pop, mezzo hard rock, que funciona melhor para o Thin Lizzy ou para o Cheap Trick.

Diametralmente oposta, “Sands of Time” é a grande composição de “Flesh & Blood”, que entra na prateleira “grandes épicos que fecham discos de hard rock“. Algo que já fizeram no desfecho de “Forevermore” (2011). Uma música com arabescos nos riffs, dramaticidade inglesa, feeling intenso, indo da inspiração em Jimmy Page para as guitarras ao refrão melódico que lembra algo do House of Lords.

E pra quem acha que Coverdale e cia não preparou surpresas, “After All” abre uma brecha para explorar texturas acústicas e mais simples. É impossível não lembrar de “Blackbird”, dos Beatles (faixa presente em “The Beatles” [1968], o clássico “Álbum Branco”, que resenhamos aqui) , com o arranjo de violão desta música.

“Flesh & Blood” é um disco que aos meus ouvidos funciona tão bem quanto (ou até melhor que) “Good to Be Bad” (2008), ambos duelando como o grande disco do Whitesnake pós-“Slip of the Tongue” (1989).

Portanto, “Flesh & Blood” é mais um discaço do Whitesnake! Genuinamente hard rock!

TRACKLIST

1 Good To See You Again
2 Gonna Be Alright
3 Shut Up And Kiss Me
4 Hey You (You Make Me Rock)
5 Always & Forever
6 When I Think Of You (Color Me Blue)
7 Trouble Is Your Middle Name
8 Flesh & Blood
9 Well I Never
10 Heart Of Stone
11 Get Up
12 After All
13 Sands Of Time

FORMAÇÃO

David Coverdale (vocais)
Reb Beach (guitarra)
Joel Hoekstra (guitarra)
Michael Devin (baixo)
Tommy Aldridge (bateria)
Michele Luppi (teclados)

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