Memoriam – Resenha de “The Silent Vigil” (2018)

 
Memoriam The Silent Vigil
Memoriam: “The Silent Vigil” (2018, Nuclear Blast, Shinigami Records) NOTA:8,5

Em 2017, o álbum “For The Fallen”  anunciou a chegada de mais um monstro do death metal, a banda Memoriam! (Você pode conferir nossas impressões deste álbum nesta resenha.)

Mas esta não era apenas mais uma banda qualquer do estilo. Era uma quimera de nomes consagrados do death metal  britânico, que conjurava riffs soturnos, maléficos e sorumbáticos enquanto soltava seus demônios musicais à moda old-school.

Produziam uma música encorpada, obscura, cavernosa, sepulcral, causticante e áspera, com menos groove se comparada a escola americana, e mais puxada para o doom metal, tudo bem impresso por uma produção orgânica e suja.

Formado por membros do Benediction e do Bolt Thrower, o quarteto lança agora, exatamente um ano após seu primeiro álbum, “The Silent Vigil”, segundo disco, refletindo uma enorme vontade de produzir e honrar o legado de seus integrantes dentro do death metal.

Em tão curto espaço de tempo, não seria estanho se “The Silent Vigil” fosse uma espécie de segunda parte de “For The Fallen”. Mas Karl Willetts (vocal, Bolt Thrower), Frank Healy (baixo, Benediction), Andy Whale (bateria, ex Bolt Thrower) e Scott Fairfax (guitarra, músico ao vivo do Benediction) foram um pouco além, exibindo criatividade aflorada, além um evidente entrosamento que contribuiu muito para o processo de criação.

Num álbum embalado numa belíssima arte gráfica, remetendo aos demônios e cultos lovecraftianos, a intensidade permanece alta, e o quarteto continua não se rendendo aos recursos que a geram de modo mais fácil, como os blast-beats (que até aparecem em certo momento da ótima “From the Flames”) ou musculares e asfixiantes passagens técnicas.

A velocidade é controlada, assim com a brutalidade, o que já não pode ser dito da maturidade evidente em cada desdobramento e curva dos arranjos. É impossível negar que estes senhores sabem manejar como poucos os elementos mais básicos do metal da morte. 

Ou seja, peso mastodôntico sustentado por uma cozinha consistente e guiado pelos riffs incisivos de Scott Fairfax. Aliás, o trabalho do guitarrista é monstruoso, esbanjando criatividade e alto poder de cativar (tente resistir ao riff de “The New Dark Ages”, ou não cair o queixo com as guitarras de “Weaponised Fear”, e falhe miseravelmente!) ao longo de um disco que enaltece a organicidade dos primórdios do death metal, com fluidez, inteligência e naturalidade de quem conhece o caminho das pedras.

Inteligência evidenciada por conseguirem cativar usando groove entremeado a momentos audaciosos, e naturalidade proeminente nas transições entre os movimentos desenrolados em cada faixa.

Isso tudo fica claro já no primeiro minuto de “Soulless Parasite”, faixa de abertura, que tem até algo da simplicidade do punk rock em sua estrutura arrastada, mas encorpada por timbragens musculares de guitarra e baixo, além da marcação firme da bateria.

Pensando bem, o disco tem muito da estética minimalista e suja do punk em seu esqueleto, trocando a raiva e a rebeldia pela aspereza, ferocidade e cadência hipnotizante do death metal, além é claro dos vocais cavernosos, com na “póstuma” “Prisioners of War”.

E neste sentido, o disco só vai crescendo em qualidade enquanto faixas como “Nothing Remains” (com aquela massa sonora tipicamente death metal e trabalho primoroso de Fairfax), “From the Flames” (com momento quase épico se pensarmos na proposta da banda), “The Silent Vigil”(uma versão death metal do experimentalismo do Faith No More. Uma aula em menos de dois minutos!), “As Bridges Burn” (brutal, com algo de Obituary, e mais uma aula de Fairfax), “The New Dark Ages” (Sim, o Fairfax aprontou aqui também!) e “Weaponised Fear” (É… O Fairfax de novo! De qual catacumba do inferno esse cara tirou o timbre desse riff?) apresentam suas armas.

Talvez por isso, possamos enxergar em “The Silent Vigil” um encaminhamento para a definição da personalidade musical do Memoriam. Raivoso, intenso, e groovado, de peso acachapante e dialogando com o legado de seus integrantes numa dinâmica entre cadência e vigor, mas mantendo o horizonte musical aberto a experimentações, principalmente em passagens climáticas e nas tangências com o doom metal.

Concordo que ainda existe muito da marca do Bolt Thrower nessa identidade (o que não é propriamente um problema), principalmente pelos vocais de Karl Willets (que está berrando feito um lunático, para a alegria da nação!), e alguma músicas funcionariam melhor se fossem menores (o que já é um problema, mas pequeno e perfeitamente ajustável), como “Bleed the Same” e na bônus “Dronestrike V3”, que ficam enfadonhas em certos momentos.

Mas veja bem, o fato de serem faixas longas não é problema, afinal “Nothing Remains” e “No Know Grave” (que riff tem essa faixa!) possuem quase o mesmo tamanho das citadas, mas funcionaram perfeitamente em uma dinâmica mais cativante, seja pelo groove ou pela criatividade das passagens desenvolvidas.

Em suma, “The Silent Vigil” reafirma a fome de death metal  do quarteto, mostrando uma busca por evolução (principalmente de Fairfax) e concisão, sendo um claro ponto de transição na maturação de sua identidade musical.

Pelo meu gosto pessoal, acredito que poderiam trazer mais composições diretas, como em “The Silent Vigil” “Prisioners of War”, e dar ainda mais dinâmica ao repertório!

E o ritmo de trabalho do Memoriam não parece que vai diminuir, afinal já prometeram mais um disco pra 2019!

Ah! E recomendo deixar o CD rolar após o silenciar de “Dronestrike V3″…

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