Tomadas as devidas proporções, “Delusions of Saviour”, faixa introdutória do novo álbum da maior instituição ativa do Thrash Metal mundial, o Slayer, irá remetê-lo diretamente à malevolência do clássico South Of Heaven (1988).
As linhas diabolicamente sorumbáticas destes primeiros minutos são devastadas pela brutal e acelerada faixa-título, forjada na mais pura pancadaria liderada pelas linhas vocais de Tom Araya e os solos de guitarra dilacerantes e velozes.
Esta dupla de abertura antecipa o que se pode confirmar ao final da audição: este álbum traz uma tentativa de misturar “South of Heaven” e “Season In The Abyss” (1990), temperada por uma produção moderna.
Em certa medida, o objetivo foi alcançado, resultando em algumas composições interessantes.
Como se não fosse dificuldade suficiente, mesmo para um baluarte do estilo como o Slayer, nos dias de hoje, se manter na ativa, o quarteto passou por maus bocados no período entre os dois últimos álbuns.
Romperam com a American Recordings, Dave Lombardo saiu novamente da banda e o pior cenário se deu com o falecimento do guitarrista e fundador Jeff Hanneman.
Segundo Kerry King, o momento em que Jeff ficou doente foi o mais difícil para a banda, pois precisavam sair em turnê e, nas palavras do guitarrista, “foi quando o núcleo da banda foi realmente abalado”.
Desta forma, Kerry King se via sozinho para fazer fluir as novas composições do Slayer, tarefa outrora dividida com Hanneman, sendo, inclusive, possível enxergar o DNA de cada compositor nas canções.
Enquanto Jeff era mais sombrio e introspectivo nos arranjos, Kerry King investia em músicas mais agressivas e rápidas, criando um equilíbrio salutar para a obra seminal da banda.
Em Repentless, a assinatura musical de Jeff Hanneman aparece no destaque absoluto “Piano Wire”, uma de suas várias composições que guardam para lançamentos futuros.
Para dar continuidade ao trabalho e registrar seu primeiro álbum de inéditas desde 2009, a dupla Araya-King, contatou o guitarrista do Exodus, Gary Holt, e o velho conhecido Paul Bostaph (vindo para sua terceira passagem na banda) para comandar as baquetas.
A escolha foi inteligente, visto que a dupla Holt-Bostaph já se conhecia do Exodus, quando registraram juntos o álbum Shovel Headed Kill Machine (2009).
O quarteto encontrou uma nova casa na gravadora Nuclear Blast e conseguiu produzir novas faixas de instrumental forte, solos viscerais e muito peso.
Além disso, ainda se encontram dentro de uma zona de conforto construída com diversos elementos tradicionais de sua trajetória dentro do Heavy Metal.
Claro que a falta de Hanneman é notória, ainda mais quando o equilíbrio das abordagens sonoras é abalado pela exclusividade de King nas composições.
Todavia, Gary Holt executa suas linhas de guitarra de modo preciso e se mostra mais competente que Kerry King nos solos, apesar de não participar do processo de composição.
Além do mais, a sonoridade da banda ganha muito mais dinamismo com a técnica de Bostaph na bateria, visto que seu estilo é menos linear do que o de Dave Lombardo.
Dentre os destaques, além da já citada “Piano Wire”, temos “Take Control” (com certo groove, além das mudanças precisas e envolventes nos andamentos), “Cast The First Stone” (mais cadenciada e com o DNA da banda), “You Against You” (com uma pegada punk/rock n’ roll nos riffs e solos animalescos), “When The Stillness Comes” (interessante contraste de vocais limpos e gritados) e “Implode”.
No saldo final, levando em conta todos os percalços que atravancaram o caminho da banda, Repentless tem muito valor, mesmo soando cansativo em poucos momentos e estando meio degrau abaixo de seu predecessor, World Painted Blood (2009).
Entretanto, esta talvez seja a melhor formação da história do Slayer e que, se mantida e bem trabalhada, pode vir a nos render ao menos dois ou três álbuns de qualidade inestimável.
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