RESENHA | Sérgio Rossoni – “Birman Flint e o Mistério da Pérola Negra”

 

“Birman Flint e o Mistério da Pérola Negra” é o primeiro romance do escritor paulista Ségio Rossoni.

O ano é 1920, e o mundo bem poderia ser o nosso não fosse habitado por animais que se comportam e vivem como nós.

Quando Birman Flint, repórter do Diário do Felino, ao lado do detetive Gallileu Ponterroaux e do amigo Bazzou, se vê às voltas investigando o misterioso assassinato de Karpof Mundongovich, agente rudanês membro do Conselho Imperial do Czar Gatus Ronromanovich, não poderia sequer imaginar o destino sombrio que os aguardava, lançando-os em meio a uma conspiração repleta de intrigas e assassinatos, transformando-os em peças de um jogo diabólico envolvendo membros de uma antiga seita e um misterioso artefato capaz de alterar o rumo de suas vidas para sempre.

Sergio Rossoni - Birman Flint e o Mistério da Pérola Negra – Livro I (2015, Chiado Editora)

Apresentado com esta sinopse e sabendo que o personagem principal, Birman Flint, é, nas palavras do autor, fruto de sua paixão por personagens como Tintim, Indiana Jones, Corto Maltese, Sherlock Holmes e uma infinidade de livros de suspense e aventura, podemos validá-lo apenas como mais uma peça infanto-juvenil.

Se ainda colocarmos numa avaliação superficial o fato de todos os personagens serem animais, costumeiramente associados aos desenhos animados e ao entretenimento infantil, podemos, perigosamente, deixar de um lado uma obra que tem uma trama profunda, que irá agradar tantos os mais novos, quanto àquelas “crianças crescidas” que irão enxergar paralelos sócio-políticos e literários de nossa própria história, pois, como bem dito na na sinopse, este mundo poderia ser o nosso!

Esta profundidade de conteúdo defendida no parágrafo anterior se confirma em algumas reflexões desenvolvidas entre as bem feitas descrições e ambientações. Além disso, alguns diálogos sagazes possuem camadas que clamam por olhos adultos.

Um belo exemplo se dá quando Maquiavel Ratatusk apresenta sua definição de religião: “o que é a religião, senão o combustível capaz de mover um grande exército, devastando seus inimigos em nome de suas crenças?”

Quem acompanha os noticiários cotidianos, certamente consegue pesar toda a parcela de verdade nesta frase do Conde, que ainda prossegue de modo incomodamente verossímil, dizendo que

“crenças estas que acabarão por estabelecer um novo período permeado por oportunidades infinitas, movidas puramente por uma engrenagem política cujo verdadeiro interesse não é outro senão o poder e o controle”.

Nestes momentos, tomadas as devidas proporções, parece que estamos diante de uma versão para entretenimento d’A Revolução dos Bichos, de George Orwell.

O universo “paralelo” criado pro Rossoni é lúdico e mistura fatos ficcionais com acontecimentos de nossa realidade, além de inspirações históricas reais que permeiam toda a intrincada teia da trama a ser desfiada por Birman Flint, um gato-repórter claramente inspirado nas mentes investigativas e aventureiras da cultura pop.

O grande trunfo, responsável por dar requinte à narrativa, esta na caraterização dos personagens, cujos trejeitos demonstram o olhar observador do escritor, não somente aos trejeitos dos animais, mas como conseguiu, de modo suave, imprimi-los de certa personalidade humana , com clichês bem explorados.

Apesar das referências declaradas do autor quanto ao personagem de Birman Flint, a carga de misticismo misturada ao contexto investigativo dado a um “civil”, junto aos desdobramentos políticos “conspiracionistas” e ao jogo intelectual contra o tempo, me fizeram vê-lo como um  amálgama felino de Tim Tim com Robert Langdon.

O desfecho revelador entrecortado pelas “confissões” de Ratatusk me deram o mesmo sabor empolgante dos momentos climáticos das obras de Dan Brown.

Além disto, por mais que seja difícil fugir da alegoria infanto-juvenil quando se pratica o antropomorfismo literário, a temática desenvolvida tem andamentos naturais à literatura adulta, com ritmo menos cinematográfico e trama distante da pasteurizada e irrelevante realidade atual dos desenho animados oferecidos aos infantes.

Conspirações, jogos de poder, espionagem e alta carga histórica são recriados com óbvias referências à nossa história, que se misturam a elementos fantásticos como feiticeiros, guerreiros lendários e linhagens sagradas, numa escrita extremamente detalhista quanto ambientações, construção dos personagens e escalas hierárquicas, apresentando cada parágrafo como a construção de uma fotografia desta versão animal de nosso mundo.

Confesso que a eloquente descrição dos ambientes (que se assemelha ao praticado pelos roteiristas de quadrinhos), em certo momento, quebra um pouco a dinâmica do livro, mas isso não faz delas dispensáveis ou inócuas, muito pelo contrário, o que temos nestas páginas é uma sobreposição de fórmulas literárias que remetem a nomes como Tolkien, Dan Brown e Conan Doyle, numa dança periódica, deixando uma enorme expectativa para a segunda parte da trama que, segundo o próprio autor, deve sair em 2017 e dará os contornos finais ao mistério da pérola negra, primeira aventura de uma possível série para o gato repórter.

Sobre o Escritor:

Sérgio Rossoni nasceu em São Paulo, em 1967, trabalhou como produtor artístico e músico até meados de 2005, passando a dedicar-se com exclusividade a sua formação como psicanalista, aventurando-se pelo universo freudiano sem deixar de lado sua percepção artística.

Apaixonado por livros de suspense, quadrinhos e filmes, além de terapeuta e escritor, divide seu tempo com outras paixões, o desenho artístico e a ilustração, utilizando-se do pincel e da tinta para inspirar-se na criação de seus personagens.

Birman Flint e o Mistério da Pérola Negra é seu primeiro romance. Vive em São Paulo na companhia da mulher e dos cinco filhos felinos.

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