Arcpelago – Resenha de “Simbiose” (2016)

 

arcpelago-simbiose
Arcpelago – “Simbiose” (2016, Masque Records) NOTA:10.

Numa busca rápida pelo significado do termo simbiose podemos encontrar referências à interação entre duas espécies que vivem juntas; ou associação entre seres vivos no qual ambos são beneficiados; e também uma associação íntima entre duas pessoas.

Após audições minuciosas de “Simbiose”, disco lançado pela banda progressiva brasileira Arcpelago, vemos que o título é preciso.

Primeiro disco do Arcpelago, “Simbiose”, traz uma interação de “espécies” da música progressiva, que vivem juntas, afinal, nestas seis faixas vemos os modos tradicionais do rock progressivo setentista amalgamado a elementos de jazz, blues e folk, e de fortes aspirações experimentações, dinamizados pelas variações de tempos, texturas e estruturas.

Originalmente formada pelo tecladista/vocalista Ronaldo Rodrigues (Massahara, Módulo 1000, Caravela Escarlate e O Terço Lado B), em 2011, no Rio de Janeiro, a banda Arcpelago fez seu primeiro show em 2015, enquanto gravava as composições que estariam em “Simbiose” entre  dezembro de 2014  e setembro de 2015.

Completada por Jorge Carvalho (baixo), Eduardo Marcolino (guitarra) e Renato Navega (bateria), a banda registrou “Simbiose”, lançado de forma independente em 2016 via Masque Records, sendo um exemplo de uma associação entre seres vivos na qual todos são beneficiados, pois fica claro como cada integrante empurra o outro em termos técnicos e de performance.

A produção orgânica captura um clima analógico bem vindo às formas progressivas por sabores arraigados à imagética clássica do gênero, aqui representado nas mais diversas formas e sutilezas.

Esta organicidade, junto a dinâmica envolvente, potencializa o resultado final das composições, sem o mofo das abordagens datadas que pipocam nos dias de hoje.

“Simbiose” é sinfônico, bem temperado pelo moog de Ronaldo Rodrigues  desde a abertura com a viajante e surrealista “Sopro Vital”.

O instrumento será uma uma bem vinda assombração onipresente nas demais composições enquanto variam por referências a nomes clássicos como Pink Floyd, Eloy, Focus, Yes, EL&P, King Crimson, Genesis,e até algo de Deep Purple (pelos teclados em parceria com o baixo robusto).

Obviamente, existe muito da cena progressiva brasileira dos anos 1970, de Casa das Máquinas, Mutantes, Som Nosso de Cada Dia, Som Imaginário e afins, aspergido nos arranjos.

Um pouco disso tudo, diluído na própria identidade do Arcpelago, longe de uma colcha de retalhos de mimetismos, mas grandiloquente nos derramamentos expressivos sustentados por uma destreza técnica que sempre bela, nunca exibicionista, como bem nos mostram “Distância Entre um Dia e Outro”“Cidade Solar”, e “Universos Paralelos”, as três faixas instrumentais do repertório.

Nesta metade de “Simbiose”, o Arcpelago nos agracia com qualidades tão variadas que enumerá-las seria até difícil.

Na outra metade, com a já citada “Sopro Vital”, junto a  “Ebulição dos Tempos”, “Dentro de Si”, temos as letras de Ronaldo dando um tom pessoal às alegorias tipicamente progressivas, enquanto a banda se desenrola em arabescos e sinuosas viagens musicais ancorados em melodias simples, transformadas em movimentos multifacetados.

O guitarrista Eduardo Marcolino é um destaque à parte dentro da formação.

Não só pelas ótimas linhas que constrói ou os belos solos, mas pela fluidez com que passeia por referências ricas de blues e jazz entremeadas ao rock, de formas inesperada e originais, ao mesmo tempo que funde influências de Robert Fripp e David Gilmour.

Um trabalho que só é possível pela capacidade de Jorge Carvalho e Renato Navega em sustentar as harmonias, enquanto praticam suas peripécias na seção rítmica.

Se é  Jorge quem guia “Distância Entre um Dia e Outro”, com seu baixo sendo a espinha dorsal da canção, Renato dá um aula de ritmo e tempo, principalmente quando chamado ao protagonismo no meio da canção.

Essa faixa  também é um bom termômetro de como a música progressiva pode ser inspirada, ousada e técnica, mas com personalidade simples; experimental e exploratória, porém, não necessariamente hermética.

Assim como “Ebulição dos Tempos”, que me lembrou, em certa medida, a ótima banda Violeta de Outono, e “Universos Paralelos”, que traz aquele algo mais dentro do folk/prog que só brasileiros conseguem manufaturar.

Falar da capacidade musical de Ronaldo Rodrigues é sempre um prazer. Ele parece aqueles mágicos que sempre te surpreendem com um final diferente para um velho número que você pensava conhecer o segredo!

Muito além dos tradicionais ensinamentos de mestres dos teclados progressivos como Rick Wakeman, Keith Emerson, ou o grande Luiz Paulo Simas, ele nos surpreende com linhas dotadas da intensidade de Jon Lord, e pontuais movimentos que desaceleram os ensinamentos de Ray Mazarek. Além disso, seus vocais são o diferencial na personalidade da banda.

Em suma, “Simbiose” foi um disco que me trouxe novamente o prazer de curtir o bom e velho rock progressivo à brasileira! E a começar por isso já merece nota máxima!

Outros Artigos que Podem Ser do Seu Interesse:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *